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Título: É a vez de Escova falar de Berlim *
Autor: Rodolfo C. Martino - publicado em 26/03/2014
 

Assim que o amigo soube de minha estada na Alemanha não se conteve. Veio me perguntar, cheio das intimidades, o que achei “da capital de todos os tedescos”.

Escova é figurinha fácil aqui, neste espaço.

Todos sabem de sua fama, em tempos idos, de Dom Juan das Quebradas do Sacomã, São João Clímaco e adjacências. Fama que aliás ele cultiva ainda hoje com carinho e devoção. Daí a inevitabilidade de buscar no baú da memória os dias em que o próprio andou pela cidade quando se enroscou com uma gringa que tocava violoncelo numa das tantas e quantas orquestras que lá existem.

II.

Não me perguntem como se deu a proeza.

Não saberei explicar nos detalhes.

Sei que a lábia do Escova tinha lá seu poder.

A “alemoa” (assim ele a chamava) era um tipaço. Veio fazer uma temporada em Terra Brasilis e, em um passeio bucólico ao parque do Ibirapuera, conheceu o dito-cujo, e deu-se o acontecido.

Assim que soube do talento musical da nova ‘mulher da sua vida’, Escova não teve dúvidas: a levou para um bate-coxa lascado no Centro de Tradições Nordestinas.

A moça ficou tão feliz que não teve dúvida em retribuir a delicadeza.

Convidou Escova para uma temporada em Berlim.

III.

Gabola que só, Escova diz que o xaxado em Berlim era manhã, tarde e noite. “No hotel, e na horizontal”. Nos intervalos, a musicista dava conta dos ensaios e das apresentações da orquestra em que trabalhava.

E você?

-- Eu ia a reboque. Tinha até lugar reservado para mim em uma frisa no primeiro
pavimento.

Escova, você gosta de música clássica?

-- Assim, assim...

Como assim?

-- Tem umas mais conhecidinhas que dá para a gente ouvir. Mas, a maioria...

E aí? O que você fazia?

-- Usava a imaginação.
IV.

Imaginação? Como assim? - perguntei ao Escova.

-- Simples, meu caro, enquanto a música tocava, eu ficava criando historinhas.

Não entendi, Escova.

-- Por exemplo. Tinha uma senhora que tocava oboé era a cara da comadre Ofélia, mulher do Torres, um pé-de-cana lá, da Vila Carioca, que adora o Zeca Pagodinho.

E?

-- E aí eu ficava imaginando o compadre confundir a patroa com a senhora, invadir o palco e pedir à mulher que tocasse “Deixa Vida Me Levar”, entre outros sucessos do repertório do Rei de Xerém.

Sou obrigado a concordar com o Escova. Seria uma cena e tanto.

V.

- Quando me cansava dessa brincadeira, olhava para a plateia de senhores sóbrios e senhoras rijas, todos em trajes sociais.

Escova, que delírio. Qual a graça disso?

-- Vou lhe dizer. Trabalhei muitos anos em uma fábrica de manequins de gesso.
Eu dava o acabamento, lixava um por um e os colocava em fila, e eles ficavam igualzinho ao pessoal do teatro. Aí eu levava um lero com eles, só no pensamento. Gastava o meu latim com as coisas do mundo...

E é legal conversar, mesmo em pensamento, com os manequins?

- Opa. Uma delícia. Quem cala consente, então eles ali quietinhos quietinhos, você
fica se achando o senhor do mundo.

VI.

-- Também gostava muito de ficar olhando o maestro, o cara era todo poderoso, mandava prender e mandava soltar, era parecidíssimo com o Ankito. Lembra aquele comediante das chanchadas da Atlântica que imitava o Oscarito, então...

Ele parecia o Ankito ou o Oscarito?

- O amigo gosta de complicar. Ele parecia o Ankito, e era todo cheio de trejeitos para reger a orquestra, o que o deixava ainda mais parecido com o comediante. Teve momentos que precisei segurar o riso para não atrapalhar a audição.

VII.

Tentei mudar o rumo da conversa.

Perguntei quanto tempo ele ficou nesse bem bom em Berlim.

Escova respondeu que uns 10 dias.

- E por que voltou, eu quis saber. O amor acabou?

- Nada disso. O marido da moça voltou de viagem – o cara é músico também, só que em outra banda. E pacifista que sou preferi evitar uma Terceira Guerra Mundial. Sabe como são os alemães nessa questão de invadir território alheio...

 
 
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