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Título: Brevíssimas 10
Autor: Rodolfo C. Martino - publicado em 31/08/2007
 

A recepcionista terminava de preencher o formulário – então, fez a pergunta de praxe.

-- Número do celular?

Silêncio.

Segundos depois, a resposta e o comentário.

-- Tenho não, moça. Sou pobre.

O homem do corredor ouviu a resposta. Andava de um lado para outro, tinha o semblante fechado e crispava os dentes sempre que consultar o visor do celular.

Interpretou a humildade do rapaz à sua maneira.

Não conseguiu segurar a reflexão que interrompeu a entrevista.

-- Você que é feliz, meu caro.

E teve ganas de atirar o pequeno aparelho pela janela do 20º. Andar.

II.

A senhora de 82 anos abriu a porta para o filho que a visita todos os dias antes de ir para o trabalho. Dividem o café da manhã e alguma conversa. Neste dia, era a própria analista política.

-- Anunciam com tanto alarde que vão adiantar o pagamento do 13º. para os aposentados. Que é uma mixaria. Agora, tentam esconder, como podem, o dia em que aumentam o próprio salário. Querem que ninguém saiba da gastança...

Quem sou eu para contrariar a dona Yolanda, minha mãe.

III.

De um texto que escrevi sei lá quando, menos ainda sei o porquê lembrei agora:

“Quase sempre, evocar o passado é construir o futuro”.

Me invoquei com esse “quase”...

Desnecessário.

“Evocar o passado é construir o futuro”.

IV.

-- Pois fique.

Ela falou sem medir o quê acabara de dizer. Conhecera a pouco o tal paulistano que estava há três ou quatro dias em Salvador. A trabalho, ele lhe disse.

Disse mais.

Iria embora no dia seguinte, por isso arriscou dar umas voltas pela orla baiana naquela noite. Entraram-se ao acaso num desses quiosques de praia.

Agora, conversavam sobre o lá e o aqui.

Na verdade, na verdade, só ele falava – e como falava...

Estava entusiasmado.

Só se entristeceu quando lembrou que partiria...

-- Pois fique.

Ela disse sem pensar. Só se deu conta da frase quando os olhos dele a fitaram demorada e sonhadoramente.

Tanto tempo depois, um sequer lembra o rosto do outro.

Mas, vá entender as razões das coisas invisíveis. Sempre que anda pela praia, não é raro a moça olhar para o quiosque e resgatar aquele momento. Arrisca até um palpiter:

-- Seria divertido.

Em meio as atribulações da metrópole e os desvarios dos amores perdidos, ainda hoje ele se pergunta:

-- O que teria acontecido se eu tivesse ficado...

 
 
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