Em Montevidéu, o professor Jorge nos recebeu com as gentilezas costumeiras.
Diria até que exagerou na dose.
Para mostrar o quanto estava por dentro dos atos e fatos da Terra Brasilis, cantarolou os versos iniciais daquela do Michel Teló, com inconfundível sotaque:
“Nossa, nossa...
Assim você me mata
Se eu te pego, ai
Se eu te pego...”
Logo o dispensamos da sequência poética e musical. Até por que tínhamos clareza de que o amigo não tinha a menor noção do significado da canção.
Evitar maiores constrangimentos é dever de todos.
II.
Fomos à capital do Uruguai participar de um congresso acadêmico – desses que muito se discute, e pouco ou quase nada se conclui – em ali ficaríamos, a delegação brasileira, três ou quatro dias.
Também quis ser simpático e informei a ele que, por minha conta e risco, ficaria mais dois dias para curtir a cidade que gosto tanto.
Jorge estranhou meu apego e minha disposição.
-- Mas, não há nada de tão atraente assim, por aqui.
III.
Respondi que já conhecia Montevidéu e suas peculiaridades. Que a cidade me lembrava – sei lá, por quais parecenças – a São Paulo dos anos 50. Quando caminho pelas ruas do bairro de Carrasco e cercanias, tenho a impressão de estar no Cambuci de antigamente, onde nasci e passei minha infância.
Para não deixar qualquer dúvida, acrescentei que, nos últimos anos, visitei o País com alguma freqüência. E enumerei minhas passagens e lembranças por Montevideu, Punta Del Leste, Colônia de Sacramento, Punta Baleña, Miriápolis...
IV.
Ele sorriu, e fechou questão:
- Vocês brasileiros têm cada uma. Com tanto sol, tantas praias, tantas alegrias, tantas mulheres bonitas, não entendo o que vêm fazer por aqui?
V.
Quase digo a verdade a ele (fujo para o país vizinho pelos motivos acima mencionados, mas principalmente para me livrar da cantoria dos micheltelós, dos teretetês e dos piripiri da vida), mas preferi nada dizer.
Evitar constrangimentos é dever de todos. |