Alguém me disse que os viu, madrugada adentro, em clima de romance, num bar temático do centro de Săo Paulo “como se o tempo năo havia passado”.
A princípio, năo acreditei.
Mas, vieram os detalhes – dia, hora, o bar temático era sobre a vida e os sucessos do cantor Nélson Gonçalves, as bebidas sobre a mesa e a conversa ao pé d’ouvido.
Os bons tempos voltaram, arrisquei ainda com ressalvas.
Mas, pensei de imediato, o que a minha prezada interlocutora lucraria “inventando” esse enredo todo?
De pronto, vieram ŕ minha mente os dias atribulados em que éramos felizes (ŕ nossa maneira) na velha redaçăo de piso assoalhado e grandes janelőes para a ruidosa rua Bom Pastor.
Ŕ época, dizíamos que o casal em questăo vivia “uma tórrida paixăo”. Gostávamos de um lugar comum, ok! Mas, os dois davam mostras para os nossos, digamos, comentários.
II.
Eram plenos, intensos. Para o mal e para o bem. Nos carinhos, no sentimento exacerbado, nos ciúmes e nas rusgas.
Ŕs vezes, os flagrávamos alheios a tudo e a todos, absolutamente apaixonados. Ŕs vezes, precisávamos apartá-los em meio ŕs discussőes sem fim.
Havia quem apostasse que o romance era para sempre. Outros, com o mestre e guru Nasci, diziam-se céticos, Por toda a turbulęncia, pelas DRs, pelas idas-e-vindas frequentes, o rompimento era inevitável.
Năo era exatamente uma bolsa de apostas, mas os bochichos também eram inevitáveis – e procedentes.
III.
Certa tarde, de forma até surpreendente, a moça apresentou a carta de demissăo e justificou que voltaria para sua cidade natal no interior de Săo Paulo.
Aparentemente, estavam bem – e continuavam juntos.
Meses depois foi a vez de o garotăo aceitar uma proposta de emprego que ele chamou de “novo desafio para a carreira”. Também nos deixou.
Resumo da ópera: perdemos os dois de vista e desconfio que, nesse embalo, os dois se perderam nas quebradas tortuosas do mundaréu que vivemos.
(Entendam: ainda năo existiam emails, faces, whats, redes sociais. Nem celular havia. Sim, meus caros, havia vida antes dessas engenhocas todas.)
IV.
Soubemos, anos mais tarde, que cada um a seu modo se ajeitou na vida. Encontraram novos trabalhos, e novos amores.
“Igual a tudo na vida”, alguém comentou, lembrando um divertido filme de Woody Allen.
Vinte, trinta anos depois ou tempo que o valha, recebo a noticio do reencontro dos amigos em uma madrugada fria do outono paulistano. Aguça minha curiosidade – será que se acertaram ou se perderam de vez? Seja como for, fica em mim a certeza de que o amor daqueles dois “cabeçudos” era verdadeiro – e que ambos viveram uma bela história. |