Foto: Divulgação
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“Tem meu voto.”
Respondo no automático ao abrir o e-mail da change.org com os dizeres:
Indiquem Chico Buarque para uma cadeira na Academia Brasileira de Letras
“Merecido.”
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Especulo comigo mesmo:
Deve ser para a vaga do escritor e crítico literário Alfredo Bosi, falecido em abril passado, aos 84 anos, em São Paulo.
Minha imaginação passa, então, a enfileirar nomes de autores contemporâneos, potenciais concorrentes que se esvaem ao emaranhar-se com versos de novas e antigas canções de Chico que guardo e sei de cor.
O mais magistral deles:
“Para sempre é sempre por um triz”.
Incrível também a arquitetura melódica e poética da (quase) ópera Construção:
“Amou daquela vez como se fosse a última.”
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Lembro alguns personagens, estoicos sobreviventes, nos livros que Chico produz ainda que esparsamente – eu os acho magníficos.
Essa Gente (Companhia das Letras/2019) é o mais recente.
Também tem o lado da dramaturgia.
Importante num momento difícil do Brasil obscurantista dos anos 60 e 70.
A trilha de Morte e Vida Severina…
Calabar…
Roda Viva é um marco de resistência do teatro Brasileiro.
“Tem meu voto”, reitero.
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No mesmo e-mail, fico sabendo que há um abaixo-assinado em andamento com quase 30 mil assinaturas. Uma ação espontânea de reconhecimento à notável obra literária deste carioca de 76 anos (que se completarão em 19 junho, se bem me lembro).
(No meu tempo de repórter precisava ficar atento a essas datas para não passar batido, e ser chamado às falas pela chefia.)
Ainda há o prêmio Camões, que recente e merecidamente o distinguiu com tamanha honraria.
Não há nome melhor, ok?
“Tem meu voto.”
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Vamos ao contraditório.
Registro agora dois inconvenientes.
O primeiro e básico é que o mané-aqui não tem direito a voto algum.
Só os pimpões e engalanados senhores dos fardões da ABL podem votar e escolher.
Segundo – e este, sim, definitivo -, por ser uma questão de fórum pessoal e intransferível:
Chico não deve aceitar.
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Motivo?
A coluna de Guilherme Amado, publicada numa das revistas Época de abril diz:
“Quando Getúlio Vargas foi eleito para a ABL, Sérgio Buarque de Holanda, pai de Chico, assinou uma carta, ao lado de Carlos Drummond de Andrade e outros autores, comprometendo-se a nunca entrar naquela casa.”
E acrescenta:
Em oportunidade anterior, Chico já fora sondado para a almejada imortalidade acadêmica-literária.
Àquela época, foi objetivo na resposta: trata-se de um compromisso hereditário.
“Nem Chiquinho (o neto mais velho) poderá entrar na Academia”.
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De qualquer forma, penso aqui comigo: seria, digamos, exótico ver Chico Buarque compartilhando o Chá das 5 com José Sarney a discutir a prosa e os sibilosos versos do livro mais famoso de Sarney, Marimbondos de Fogo.
Olaiá.
Sigamos…
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O que você acha?