Foto: Arquivo Pessoal
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A César o que é de César.
Ao Escova o que é do Escova.
Foi o amigo Escova direto dos arredores de Paris quem me sugeriu, via zap, a história que hoje lhes conto.
Disse para incluí-la na série de posts/crônicas dos 50 anos de Jornalismo que este destrabelhado repórter exalta no decorrer deste 2024 que ora se encerra.
Ressalta que o título original, por si só, é bem sugestivo:
O dia em que Umberto Eco quase foi pauta na Gazetinha.
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Calma, calma, não riam – e acreditem.
Éramos inventivos, mas nem tanto.
Porém, tenho que lhes confessar que, de fato, tal possibilidade apareceu numa de nossas ruidosas reuniões de pauta.
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Foi assim que a coisa toda aconteceu.
Andava pela velha redação de piso assoalhado e grandes janelões para a rua Bom Pastor uma estagiária de nome Cássia, era estudante do terceiro ano de jornalismo.
A moça andava aos suspiros. Sempre que aparecia uma deixa, ela enaltecia, encantada, um de seus professores, um tal de Jair, que havia aproveitado as férias de fim de ano para ir a Milão trocar figurinhas acadêmicas com Umberto Eco sobre filosofia e comunicação.
Era o que a Cássia dizia – e, nós ficávamos na nossa, indiferentes à proeza do moço.
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Então naquela tarde de sexta-feira quando programávamos a edição da próxima semana, ela não se conteve. Pediu a palavra e desandou a falar do ilustre professor. Que ele era isso, era aquilo. Que trouxe muitas novidades da conversa com o intelectual italiano. Que suas aulas eram sobre conceitos, paradigmas, processos comunicacionais, teorias diversas…
Que ela amava as aulas…
Desconversamos.
Brincávamos que ela parecia mesmo, digamos assim, apaixonada, não só pelas aulas.
(Escova se dizia especialista em flagrar esses lances e romances.)
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Naquele dia, ela chegou ao exagero em propor: deveríamos entrevistar o professor para dizer aos nossos queridos leitores como foi o encontro entre dois próceres da Comunicação. Quem sabe até pedir um artigo exclusivo ao italiano Umberto Eco?
O mundo – a começar pelo Ipiranga – precisava ter consciência dos notáveis avanços no âmbito comunicacional e humano.
Como editor, achei que a Cássia estava indo longe demais -e, sem delongas, vetei a pauta e os delírios.
Mas quem derrubou mesmo e desmascarou o homem foi o contínuo da redação, o Devito.
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Devito era um garoto bom, superprestativo e antenado.
Era seu primeiro dia depois das férias – e a todos surpreendeu. Conhecia o professor de outros, digamos, carnavais. Ouviu a conversa toda e foi na veia: garantiu que o Jair passou todo o verão em Peruíbe e que a história de ter ido para a Itália, encontrar Umberto Eco era uma grande balela.
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E o Devito, à época, concluiu:
“O cara é maluco_beleza. Adora uma conversa fiada. Mas, é dos nossos, figura mesmo. Mas, não sei se vale uma entrevista. O Ipiranga é um bairro bem conservador.”
Moral da história:
A moça ficou tão desolada, tão desolada que nunca mais voltou para concluir o estágio.
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O que você acha?