Não sei o porquê, nem como a conversa virou um discreto desabafo.
Falávamos sobre amenidades. Invariável, caímos no diz-que-diz das redes sociais, as memes, os grupos de amigos/inimigos no whats, os salmos de ‘bom dia’ ou ‘boa noite’, os textos apócrifos que autores famosos nunca escreveram, a vida que passa e a gente de olho grudado na tela do celular.
“Que mundo é esse? ” – falei por falar.
Do nada, a moça fez ares de sonhadora, e soltou a voz:
“Mas, eu gosto mesmo quando ele aparece no whats, e deixa uns recadinhos fofos em áudio. Adoro. Toda mulher gosta de se sentir amada, desejada, especial. ”
Pensei em perguntar: quem era o galã?
Ela não escutou (ou fez que não escutou). Continuou falando e deu pra intuir a história toda.
“Quando estávamos juntos, era bom demais. Delícia. Mas, confesso, sinceramente, nunca consegui definir o que sentia por ele. Sei que ríamos muito, me sentia legal, mas, ao mesmo tempo, sei lá…”
Esse “sei lá” é o que pega, digo. Sem que ela novamente me ouça, tão entretida que está nas próprias lembranças.
“Desconfio que ele gostaria que engatássemos uma relação mais estável, duradoura. Bem que tentou levar adiante uma conversa nesse sentido. Eu não lhe dei ouvidos. “
Qual o motivo, perguntei.
Desta vez, creio que me ouviu. Respondeu no automático, ainda com olhos voltados pra dentro de si.
“Minhas amigas diziam que nós não combinávamos. Parecíamos seres de planetas distintos, de séculos distintos. Ele, quietão, discreto, sóbrio, pouco afeito a grupos, multidões. E eu, só no agito. Baladeira que só. Não se tem 20 anos duas vezes na vida, não é? ”
Eitaaa…
Era o que eu temia. Sou um bom ouvinte. Mas, palpitar, embora adore, não é exatamente a minha praia. Não tenho expertise no assunto; talvez o amigo Escova, o ex-Don Juan das Quebradas do Mundaréu, lhe desse uma resposta mais precisa.
Eu apenas balancei a cabeça, num claro sinal de que não tinha a resposta que a moça procurava.
Ela sorri diante da minha hesitação.
– Vocês homem são todos iguais. Aposto que está com peninha dele, né…
(Eu, hein, não disse nada. Ela que intuiu tudo.)