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Epitácio

Epitácio era um amigo querido que andava distante. A bem da verdade, o distanciamento se deu mais em função da minha mudança de emprego. Deixei a velha redação de piso assoalhado e grandes janelas para a rua Bom Pastor e fui cuidar da vida na Universidade Metodista em São Bernardo do Campo. Raras vezes, quase nunca, voltei ao Ipirangão velho-de-guerra que, por anos e anos, me acolheu e onde fiz tantos amigos.

Epitácio era um deles.

II.

Nós nos conhecemos quando ele se apresentou como novo colunista do jornal para a área de Economia, trazido pela proprietária do mesmo, dona Araci Bueno.

A partir daí, tínhamos contatos semanais para discutir o tema da coluna e, vez ou outra, apenas para comentar o momento político que atravessávamos. Nem sempre conjugamos as mesmas ideias. Mas, a discussão mais esclarecia do que nos punha em conflito.

Epitácio era dono de um dos principais escritórios de contabilidade da região – a Rhemor – e sempre usava a carteira de clientes para abalizar os humores econômicos. Era pragmático, portanto; mas raramente deixava de ter razão.

III.

Destaco dois momentos em que pude contar com a ação do Epitácio para me ajudar.

A saber:

1 – Quando lancei meu primeiro livro “Às Margens Plácidas do Ipiranga”, o homem me arranjou palestras e visitas a zilhões de entidades e clubes de serviço. Era bem relacionado na região e diria que foi o meu maior vendedor de livros. Não satisfeito, no final daquele ano (1997), arranjou outros tantos empresários que compraram uma boa quantidade de exemplares como brindes natalinos.

2 – Em outro período, foi o Epitácio quem tratou da minha saída do jornal. Depois de quase 30 anos por ali, eu não me sentia mais motivado a continuar. O jornal já não era mais o mesmo, atravessava um período difícil e minha carreira na Universidade decolava – e passou a ser minha prioridade. O amigo cuidou de ser o elo de ligação entre as partes. Por pura amizade, fez com que as negociações chegassem a um bom termo.

IV.

Nos últimos tempos, voltei a encontrá-lo por duas ou três vezes. Tenho uma empresa – dessas de emitir nota quando faço (ou fazia) algum frila – que preciso fechar e busquei sua ajuda. Ele ficou de dar uma olhada na papelada e depois me informar.

– Vamos almoçar qualquer dia, prometeu.

Ele gostava dessas conversas sem fim sobre política e economia.

– Claro, claro… É só marcar.

Foi assim que nos despedimos.

V.

O amigo morreu no sábado – e só ontem fiquei sabendo.

Liguei para o escritório para saber a quantas anda o processo de encerramento da empresa – e a Tânia, a secretária, me deu a triste notícia. Ela falou que foi de repente, disse o nome da doença que se complicou de forma fulminante e…

Sinceramente, não prestei atenção no que dizia. É verdadeira aquela história do filme que passa na cabeça da gente nesses momentos limites. Inexplicável o sentimento de perda, e do quanto somos efêmeros. O tempo é mesmo implacável.

Que o Senhor o tenha em bom lugar, amigo.

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