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Memórias de um abelhudo

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Foto: Edição do Rock in Rio 2022/Divulgação

Lembro a cena.

Parece que foi ontem.

Subo um a um os degraus das escadas que me levam a uma das salas do labirinto das artes, o Teatro Ruth Escobar.

Acompanho o tropel de jovens cabeludos e moçoilas descoladas que rumam, enleados, para o show do cantor e compositor Taiguara naquela longínqua tarde de domingo.

Taiguara fazia sucesso nas rádios com a música “Hoje”.

O homem havia lançado um álbum de capa azul, repleto de lindas canções – mas, não era exatamente um ídolo pop aos moldes de Roberto ou dos baianos Gil e Caetano.

Eu gostava mesmo de ouvi-lo interpretar “Helena, Helena, Helena”, de Alberto Land (1945/2002), vencedora do I Festival Universitário da Música Popular, realizado pela TV Tupi.

Quando foi isso, meu Deus?

Idos de 60. Muito provavelmente 1968 ou 69.

Se estiver certo, então eu tinha 17 para 18 anos.

E, cá para nós, todos os sonhos (e angústias) do mundo.

Minha geração não foi lá tão festeira assim.

Amávamos as várias vertentes musicais, especialmente aquelas que diziam aquilo que ousávamos pensar, sentir e dizer.

Por que me ocorre essa lembrança agora ao ouvir, de abelhudo que sou, a conversa de um grupo de jovens (e alguns não tão jovens assim) sobre a aventura que logo essa turminha se empenhará em viver para ver e ouvir as atrações do Rock in Rio?

Estão entusiasmados – e não há como lhes negar a razão.

– Vamos nessa, tiozão?

Não sei se é uma provocação ou um gentil convite.

De qualquer forma, descarto de pronto.

Não sou – e talvez nunca tenha sido – dessa tribo.

Sou um senhor de idade provecta. Nos conformes da idade.

Aliás, nem sequer ouso entendê-los ao listarem as tantas e quantas atrações “imperdíveis” do megaevento.

Se conheço uma ou duas das tais, está de bom tamanho.

Ora dirá meu amável leitor e perguntará a amorosa leitora:

Nada a ver uma coisa com a outra, né?

Pois é…

Nada a ver.

Mas, juro, foi a lembrança que me bateu no exato instante do bate-papo descontraído.

Para ser sincero, lembro vagamente do espetáculo em si.

Lembro o Taiguara cabeludaço, de calças vermelhas, ao piano, a empilhar versos sobre versos em suas pungentes melodias.

Quase não falou à plateia.

Estávamos um tanto apreensivos.

Diziam que Taiguara era um “inconformado”, uma juramentado “marxista-leninista” – e que os blindados da ditadura militar poderiam aparecer a qualquer momento para prendê-lo e levar a plateia toda.

Havia uma moça bonita em cena que tocava viola e fazia alguns vocais.

Talvez fosse a jovem Marluí Miranda, mas não tenho certeza.

Vida afora assisti a centenas de shows.

Trabalhei como repórter na cobertura de muitos e muitos deles.

Até no furdúncio molhado que foi o show dos Rolling Stones no Pacaembu, com abertura de Rita Lee em sua fase áurea, eu estava lá entrevistando os fãs encharcados pela chuva intermitente.

E como esse, estive em outros tantos.

Um superbadalado Holywood Rock, por exemplo. Repleto de atrações nacionais e internacionais. No estádio do Morumbi, em São Paulo.

Ao meu lado, um gaiato, bebaço, cantava e dançava aos sons dos hits de Lulu Santos. Ao mesmo tempo em que, aos berros, perguntava, para espanto geral, se haviam convidado a Lady Zu.

Que pazzo!!!

Lembranças, lembranças…

Só não consigo explicar a fixação pelo pocket show do Taiguara quando a conversa – para qual nem fui chamado e da qual não participava, nem tinha lugar de voz – era sobre o Rock in Rio.

Nem Freud explica.

Vai ver não tem explicação.

Também não vou ao Google tirar minhas dúvidas.

Perderia, creio, meu próprio encantamento com minhas imprecisas, vagas e mágicas recordações de um outro tempo, de um outro mundo.

Ainda nenhum comentário.

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