Manifestação no Rio de Janeiro/jul. 2025/ Foto: Fernando Frazão/Agência Brasil
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A partir dos comentários de amigos e leitores sobre os posts dos últimos dias – que, um tanto lá, outro tanto cá, versam sobre os delírios autoritários de Trump e seus subservientes seguidores brazucas –, ocorre-me lembrar as eleições municipais de 1985 em São Paulo.
Diria que foi meu primeiro espanto com as coisas do obscuro mundo político-eleitoral.
(Não sei se a palavra adequada é espanto.
Usei ‘‘espanto’’ para não falar em profunda decepção com a inalienável verdade dos fatos.)
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Tento explicar.
À época, confesso, fiquei atarantado com a vitória de Jânio Quadros que disputou o cargo de prefeito de São Paulo com o então senador Fernando Henrique Cardoso, sociólogo e representante declarado do campo progressista democrático.
Como assim? – atônito, em vão questionava a mim mesmo.
Jânio representava o atraso, o retrocesso, a volta ao passado sombrio.
Detalhe importante: isso seis meses após a redemocratização do país, a tragédia de Tancredo Neves e o acordaço que permitiu a posse de José Sarney como presidente da República.
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Era um jovem repórter. Quer dizer, mais ou menos: tinha 34 anos.
Fiz minha estreia na cobertura de eleições três anos antes, em 1982. Aquela que fez de Franco Montoro o governador do Estado de São Paulo e que o MDB, o partido da Oposição ao regime ditatorial, elegeria “até um poste”, como se dizia naqueles idos e sonhadores anos.
Como assim? – intermitente, a pergunta ia e voltava em minha cabeça.
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Não conseguia entender.
Com a vitória insofismável de Jânio, houve o resgaste de várias lideranças, apoiadores do regime militar, que imaginávamos tolamente fora do jogo político.
A partir da vitória do Homem da Vassoura, também em âmbito federal se viu uma guinada à direita no Governo Sarney. “Afinal, São Paulo é a locomotiva do país”, lembrou-me uma experiente e felpuda ‘‘raposa’’ de larga experiência política e, cá pra nós, simpatizante dos milicos no poder.
“Nem fomos e já estamos de volta” – zombou o malévolo senhor, consciente que estávamos, nós da turna da velha redação, ideologicamente em lado opostos.
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Durma-se com tamanho barulho.
Inconformado, recorri, como sempre fazia então, ao mago e guru, o amigo Nasci.
Ele não era propriamente o hermitão da montanha, mas sabia das coisas.
Que tentasse me explicar o que estava acontecendo.
Que caspita, Jânio Quadros fazia no contexto político dos anos 80 depois de ter feito o que fez nos anos 60 e ser uma das causas que jogou o país nos braços da ditadura por 21 anos?
“O que significa tudo isso, Nasci?”
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A resposta do mestre:
“O problema não é o Jânio. O “x” da questão, amigo, são as pessoas que se identificam e votam no Jânio ou em outros bravateiros do gênero. Talvez nós, os que se julgam progressistas e bem intencionados defensores da democracia, os tenhamos subestimados. Um grave erro pois eles sempre existiram. Existem – e, lamento informar, sempre vão existir.”
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TRILHA SONORA
“Por dentro com a alma atarantada
Sou uma criança, não entendo nada“
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O que você acha?