Foto: Reprodução do Facebook
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Tentarei ser breve.
(Mas não garanto.)
Triste terça-feira.
Não imaginei escrever o texto que hoje escreverei.
Ora, pois, eis a cilada de um tal Sr. chamado Tempo que nos impõe rumos, tinos e desatinos.
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O que posso lhes dizer de Rita Lee que, desde ontem, se fez saudade, se fez vazio, se fez estrela?
Não à toa, seus funerais acontecem hoje no Planetário do Ibirapuera.
Rita se faz luz.
Versos e canções.
Atos e intenções.
Rita se faz legado.
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Começo do começo.
Somos da mesma e indivisível geração. A do pós-guerra. Garotos e garotas que amavam os Beatles e os Rolling Stones e, à nossa maneira, ousaram mudar o mundo. Roqueiros, psicodélicos, hipongas, transversos em busca da almejada Era de Aquarius.
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Faça-se, porém a ressalva.
Miss Rita Lee Jones sempre nos foi referência e guia por estar à frente do seu tempo.
Desde sempre: ousadia e coragem.
Rita Jeep, a menina dos Mutantes.
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Quando nós, os iguais, entendemos nossa juventude – e timidamente esboçávamos alguma transgressão, ainda que tímida -, Rita já causava na tela da TV em meio a guitarras dissonantes e encantamentos. Era presença fixa no programa do príncipe Ronnie Von, ao lado de Arnaldo e Sérgio Dias.
De repente, outra surpresa a quebrar mitos e ritos do arcabouço da tradicional MPB.
No palco, desafiadora, ao lado de Gilberto Gil a entoar a elétrica Domingo no Parque no Festival dos Festivais do ano santo de 1967. Vaias e mais vaias. Aplausos e o indefectível prenúncio de novos tempos, da geleia geral brasileira.
Mesmo naqueles idos obscurantistas, era possível o sonho que se sonha junto e se faz realidade.
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Já como jornalista, repórter na área de Cultura, o primeiro disco que me coube comentar foi nada menos Fruto Proibido, base da tão sonhada carreira solo de Rita.
Não me lembro bem da entrevista à Imprensa. Lembro, sim, da arrebatadora presença de Rita e do espanto da reportada diante da canção Ovelha Negra que, ao longo do tempo, se fez hino de gerações, as mais diversas.
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Meses depois, entrevistei a parceira e amiga Lucinha Turnbull que, àquele momento, tentava emplacar a própria carreira solo. Falamos mais Rita do que do disco Aroma que Lucinha acabava de lançar pela Emi/Odeon.
Inevitável.
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Ainda nos anos 70, outra lembrança majestosa. O show Refestança que fez ao lado de Gilberto Gil. Um happening. Um afago ao novo Brasil, democrático e igualitário, que se forjava em nossas mentes e atos e fatos.
Rita, presença magnânima.
Bem vinda a redemocratização.
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A explosão de Rita aconteceu nos anos 80. Ao lado do marido e parceiro Roberto Carvalho enfileirou um sucesso atrás do outro. Não saberia listá-los por aqui tantos e tamanhos que foram e são. Trilha sonora da vida de quase todos nós.
Eu, pessoalmente, escolho este:
“Na medida do impossível
Vai dando pra se viver
Na cidade de São Paulo
O amor é imprevisível
Como você e eu
E o céu”
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Meados da primeira década do novo século, um grupo de estudantes de Jornalismo me procura na Universidade onde leciono. Tem como proposta para o Trabalho de Conclusão de Curso um livrorreportagem sobre os 40 anos de carreira de Rita Lee. Topei o desafio de ser o orientador das meninas – e, algo sensibilizado pela escolha, tocamos uma divertida e jornada de meses de pesquisas, entrevistas e o redação do texto final. As autoras Andrea, Carolina, Denise, Fernanda, Juliana e Mariana fizeram um belíssimo trabalho. Deram ao livro o título de Simplesmente Rita e, já naquele distante 2006, me ensinaram que Rita Lee se faria eterna, definitiva e inspiração para quem insiste em acreditar numa sociedade libertária, diversa, inclusiva. Plena e solidária. Um Planeta amorosamente mais feliz.
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Rita se faz luz, e saudade.
Desde sempre, ela cantava:
“As luzes da cidade
Não chegam às estrelas
Sem antes me buscar”
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O que você acha?