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Visita ao castelo de São Martino*

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Foto: Arquivo Pessoal

Hoje, 11 de novembro, a Igreja Católica Apostólica Romana reverencia a memória de de São Martino (397/478), o dono do manto que cobriu Jesus.

Visitei o Castelo de São Martino, em Napoli, naquele inverno de 2007.

Permitam-me, amigos, contar-lhes a lembrança que tenho daquela jornada.

O CASTELO DE SÃO MARTINO

Olhamos o mapa da cidade e o castelo de San Martino, onde existe um museu e uma igreja, ficava a dois dedos de distância do hotel. Um alívio.

No dia anterior, havíamos caminhado à exaustão para conhecer atrações, becos e bocas de Napoli.

Um aspecto cansado era indisfarçável em mim, e em cada um de nós.

Mas, vamos lá…

Ao primeiro desafio do dia. Uma passada no calçadão à beira mar. Mais uma vez, olhar o porto onde meus avós, lá nos confins do tempo, partiram para tentar a vida no Brasil e “perna pra quem te quer”.

Uma última conferida no mapa para nos orientar e a surpresa que me deixou um pouco triste e outro tanto feliz. Triste porque bastou erguer os olhos, do mapa para o real cenário da cidade, e divisarmos uma fortaleza, lá distante, no alto de uma montanha – uns 650 metros de altura, por aí.

Em súbito protesto, meu corpo cansado despencou desalentado no primeiro banco de praça que apareceu.

Não conseguiria.

Napoli é um labirinto de ruas estreitas e tortuosas, vielas, escadarias, cantos – tudo devidamente ornamentado pelas roupas estendidas nos varais e expostas aos olhares de quem passar. Dá a sensação de que estamos sempre no mesmo lugar. Impossível o acesso.

Aí veio o motivo da felicidade.

Por consenso, decidimos: iremos de ônibus.

Me pus de pé de pronto.

“Vamos!”, dei voz de comando à tropa.

“Mas, qual é o autobus?”, alguém lembrou.

Dá-lhe de andar às tontas pela cidade. Paro diante da vitrine de uma loja da Armani – e é um entra sai de gente sem nada comprar, óbvio -, um “saldi” imperdível na Piazza Itália – e tome outra excursão dentro da nossa quase excursão.

Há sempre quem queira parar para tomar um café.

“Um café só, gente!” e invadimos a cafeteria. Resultado: duas horas depois, é hora de almoçar que ninguém é de ferro.

Fomos descobrir o roteiro mesmo só lá pelo meio da tarde, mais do que cansados, a carregar pacotes e casacos – pois, o tal do rigoroso inverno europeu não deu às caras – e eu a arrastar um fastio, uma sonolência gerada pela generosa porção de tortellini que derrubei na refeição.

Ah!, o biquieri de vinho rosso também ajudou minha alma a clamar, baixinho, para os botões do meu sobretudo a lamber estoicamente aquele chão histórico:
— Meu reino por uma cama. Meu reino por uma cama.

Capítulo 2

Um detalhe.

Não era um simples autobus que nos levaria ao destino que planejamos.

Teríamos que tomar o funiculare, uma espécie de “tatuzão” em forma de bondinho que leva penca de turistas e moradores montanha acima, por dentro da própria.

Só que a Estação Chiaia – jamais esquecerei esse belo nome – não estava funcionando naquele dia. Chiusa!

Portanto, outra caminhada pela via Toledo para enfim, já na estação, errarmos a linha do tal “metrôzinho” e irmos parar do outro lado da cidade.

Voltamos ao ponto de partida.

E, por fim, tomamos o caminho do castelo que anunciei, aos quatro cantos desde a chegada à Itália, era de posse da família Martino.

Ao chegarmos, a compensação de todos os “ais”: a tocante visão da baía que se tem da pequena praça em frente à fortaleza.

Um encantar-se sem fim.

Capítulo 3

Uma pequena porta dá acesso ao claustro, projetado por Dosio no século 16, e às diversas alas do castelo, todas no melhor estilo do barroco napolitano.

Sempre me deslumbro diante desses monumentos seculares e suas histórias.

Vai aí uma sensação do efêmero da vida – a fundação do que chamam de ‘certoza’ é do século 14. Do quanto somos nada e da obra que deixamos ou deixaremos.

O nobre Martino (desculpe aí, em plebeus) era um homem de fé e íntegro. Generoso com os pobres, é celebre o seu gesto de cortar o manto com a própria espada e dividi-lo com quem encontrasse passando frio.

(É bem verdade que não entendi porque o príncipe não oferecia o manto todo. Bom, história é história e há um quadro famoso que perpetua o gesto.)

Certa noite, reza os sacros escritos, Jesus apareceu-lhe em sonho. Usava a metade do manto doado por Martino e disse aos anjos que o rodeava:

“Este aqui é Martinho, o soldado romano não batizado: ele me cobriu com seu manto” .

Ando pra cá, ando pra lá.

Descubro um terraço com outra visão linda sobre o bairro histórico de Santa Lucia. Um jardim; atrás do jardim, um pomar com árvores repletas de laranjas. Volto e entro por uma ala desconhecida.

Ouço uma voz:

— Signore, signore. Chiuso. Capisce? Chiuso, signore.

Meu paciente filho faz a tradução, com um sorriso diante da minha cara de espanto.

— Pai, aí não pode entrar. Está chiuso. Fechado, entendeu?

Levei tão a sério a história de estar numa propriedade da família que, sinceramente, não estranharia se alguém me viesse entregar a chave do castelo.

Ou, no mínimo, de parte dele.

Mesmo assim, não perco a pose.

Mesmo com a temperatura ambiente, visto o sobretudo com a nobreza de um legítimo Martino. Me desculpo com o atento funcionário e dou por encerrada a visita.

Antes, porém, faço a ressalva:

— Por essa vez passa, filhão. Mas, da outra vez, tiro o passaporte, mostro o sobrenome e digo ao lacaio o que pode, o que não pode e quem manda nessa birosca.

*Texto originalmente publicado em janeiro de 2007

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