Ilustração: reprodução do Instagram
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Ah, aquele estranho dia que nunca chega…
E assim a gente se vê no oco do mundo. Na vã espera do próximo segundo, do próximo passo, da próxima notícia, do proximo capítulo, da próxima catástrofe mais do que anunciada.
Nesse ‘buraco negro’ de ideias e ações, sempre que posso recorro às crônicas do mestre Luis Fernando Veríssimo em busca das palavras que me faltam para o post de hoje.
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Ao acaso, folheio um livro antigo – e lá me deparo com o parágrafo inicial da enigmática crônica Nova Metafísica (*).
Escreveu o mestre:
“Deus não joga dados com o Universo”, disse Einstein, para nos assegurar que existe um plano por trás de, literalmente, tudo, e que o comportamento da matéria é lógico e previsível. A física quântica depois revelou que a matéria é mais doida do que Einstein pensava e que o acaso rege o Universo mais do que gostaríamos de imaginar, mas fiquemos com a palavra do velho. Deus não é um jogador, o Universo não está aí para Ele jogar contra a sorte e contra Ele mesmo. Já os semideuseus que controlam o capital especulativo do planeta Terra jogam com economias inteiras e podem destruir países com um lance de seus dados, ou uma ordem dos seus computadores em segundos.”
Às vezes, os tais semideuses não têm uma cara – destaca o cronista ao se referir concretamente aos operadores financeiros diversos com poderes sobre nossas vidas “que fariam o Deus de Einstein invejaria”.
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Detalhe profético:
Veríssimo cravou essas linhas ainda quando Éfe Agá (assim ele grafava o nome de Fernando Henrique Cardoso) era o presidente.
Anos 90.
Os neoliberais, eram os inimigos da vez.
Eles mesmos, os tais, que pensavam “ter liberado o mundo de uma ilusão inútil, a viabilidade de uma sociedade fraterna”.
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Hoje as forças do mal são mais diversas. Toscas, retrógradas, nefastas.
Mesmo assim, me empenho em acreditar que a ilusão de uma Humanidade Solidária (com H e S em caixa-alta) persiste em muito de nós, os que acreditam e sonham.
E, apesar de todos os pesares, insistem na resistência (ainda que anônima e quase silenciosa).
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Pode parecer contraditório o que lhes digo.
Há um tom cético nas palavras de Veríssimo – e agora eu lhes proclamo a fé em dias melhores para todos.
???
Calma que eu explico.
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Mesmo em meio a tantas tristezas e desiluções, ando bastante surpreso (para o bem) com a reação de ajuda espontânea dos brasileiros com o drama de proporção descomunal vivido pelo povo riograndense.
Enxergo aqui uma réstia de esperança.
Apego-me firmemente a ela, apesar de entender que há muito, muito, ainda por fazer até que alcancemos aquele estranho (e almejado) dia que nunca chega.
Ser consciente e terno é o primeiro passo para a mudança.
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* A crônica de Veríssimo foi publicada no livro Aquele Estranho Dia Que Nunca Chega – as melhores crônicas de política e economia (Objetiva, 1999/Rio de Janeiro).
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O que você acha?