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Crônica de uma morte anunciada…

"Vencer a si próprio é a maior das vitórias" (Platão)

01. A dona de casa procurou a Redação de Gazeta do Ipiranga. Dizia-se assustada, em pânico mesmo. Por duas vezes, num prazo de 20 dias, já havia sido assaltada no mesmo lugar — o cruzamento da rua Vergueiro com a avenida Tancredo Neves. No primeiro, só pegaram alguns trocados. No outro, levaram a bolsa com documentos e tudo mais. Ficou mais indignada ainda quando soube que essas ocorrências eram diárias — e que as autoridades, mesmo avisadas, nada conseguiam fazer… Sinais dos tempos — consolou-se. Muitas vítimas sequer dão queixa à Polícia…

02. Na noite de quinta-feira (17/05), o filho chegou em casa com a notícia. Levaram o Vectra num assalto à mão armada no mesmo local — e não eram ainda 21 horas. O rapaz dava-se por feliz de escapar ileso da ação dos marginais… No dia seguinte, a mãe procurou a Redação de Gazeta do Ipiranga para um desabafo: todos sabem que aquele é um ponto crítico — inclusive a Polícia. Então porque não colocam uma viatura de plantão por ali…

03. No dia 26 de maio, a edição de Gazeta do Ipiranga circulou com a reportagem "Vergueiro com Tancredo". Aqui, o perigo dos assaltos ressaltando a necessidade de policiamento ostensivo para o local…

04. Por volta das 22 horas de segunda-feira, a pediatra Natália Rodrigues parou por causa do semáforo no cruzamento da rua Vergueiro com Tancredo Neves. Natália dirigia o Vectra do noivo e falava ao celular com o cunhado quando percebeu uma aproximação suspeita. Vou ser assaltada… estou sendo assaltada… não… não… Do outro lado da linha, ele ouviu o disparo… O Vectra andou alguns metros e chocou-se com a traseira do caminhão que estava a sua frente…

05. Natália morreu na manhã de terça-feira no Hospital Heliópolis em conseqüência de um tiro na cabeça… Poderia escrever que essa jovem de 34 anos morreu também — e principalmente — pela omissão de nossas autoridades, pela insensibilidade de todos nós que fechamos os olhos diante da miserabilização da sociedade e da extinção de valores humanitários como respeito, fraternidade e senso de justiça… Poderia escrever um tratado sociológico de causas e efeitos, de consciência e cidadania… Nada disso, porém, compensaria o vazio desta morte que, como tantas outras que acontecem nesta cidade sem-lei, poderia ser evitada…

06. E aqui ficamos nós, jornalistas, a amontoar letrinhas e impotentes diante da vida. Até quando…

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