É a vontade que faz o homem grande ou pequeno – Schiller 01. O amigo Chico Jornaleiro completou 80 anos nesta quarta, dia 10. Não sabia por onde andava o companheiro que, em pleno dia de seu aniversário, me presenteou com um telefonema. Falou que
está assim, assim de saúde, e tem muita saudade dos tempo em que sua banca, que se localizava na esquina da Silva Bueno com Sorocabanos, era ponto de encontro de amigos.
Era ali que, logo pela manhã, a gente colocava a conversa em dia, fosse qual fosse o assunto: política, futebol ou os filmes que estavam em cartaz num dos onze cinemas do bairro. 02. Tempo bom, como ele fez questão de lembrar. São Paulo era uma pacata cidade em desenvolvimento. Tranqüila, como os homens engravatados e de chapéus. O maior cuidado que se tinha era olhar, com cuidado, ao atravessar a rua para não ser atropelado pelo bonde-camarão, que ligava o Ponto Fábrica no Sacomã à Praça João Mendes. 03. São 75 anos de Ipiranga, diz Chico. Foram 64 só como jornaleiro e, acrescenta ele,
a grande honra de ser o primeiro jornaleiro a entregar Gazeta do Ipiranga. O primeiro ‘pacote’ de jornal que chegou à banca sumiu rapidamente.
As pessoas desde logo aprenderam a ter muito carinho com a Gazetinha porque ela fala das coisas que são nossas, sempre defendeu o bairro e lutou para que o Ipiranga tivesse representantes que honrasse seus mandatos. 04. Era jovem ainda quando entrevistei Chico pela primeira vez. Talvez ainda cursasse o terceiro ano de jornalismo na Universidade de São Paulo quando vim fazer um estágio na redação de GI. Acabara de passar duas semanas no Diário da Noite e ainda não havia captado, com exatidão, o sentido social do que era ser jornalista. É certo que o jornal de Assis Chateaubriand não vivia um bom momento. Na verdade, estava em seus extertores e as coisas funcionavam quase que mecanicamente por lá. Os profissionais mais experientes resolviam as questões rapidamente — como só e acontecer num jornal diário — e o pobre estagiário ficava ali só vendo o que acontecia, com direito a ouvir as lamentações habituais de quem está na labuta há muito tempo.
Ô rapaz, vai procurar outra coisa pra fazer. Jornalismo não dá camisa a ninguém. É só trabalhar, trabalhar, trabalhar. Escuta o que digo… 05. Nada animador, concordo; apesar de ter lá seu fundo de verdade. 06. A entrevista com Chico Jornaleiro, uma das primeiras que fiz, mostrou o outro lado da notícia: o leitor. É a ele que devemos orientar o nosso trabalho. A função crítica e fiscalizadora, que é inerente à profissão, tem como razão principal informá-lo e, de alguma forma, prepará-lo para os enfrentamentos cotidianos. Somos uma ponte entre a realidade e o leitor. Nem sempre os jornalistas entendem essa simplicidade – e se arvoram como senhores da verdade absoluta (veja o caso dos cronistas esportivos na recente Copa do Mundo), adotam tons discursivos e se julgam acima do bem e do mal, com seus conceitos e vereditos. Mas, isso é outra história. 07. O que aprendi com Chico foi trabalhar com alegria. E ter amor ao que se faz. Fazer do seu local de trabalho não o muro das lamentações, mas um lugar onde se prioriza a vida e, sobretudo, as amizades…Quem dera hoje eu pudesse ser reconhecido como Rodolfo Jornalista assim como Chico é e sempre será Chico Jornaleiro. RCM
Jornalista
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