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Oração do homem comum

"Se Deus é por nós, quem será contra nós" (São Paulo)

01. Não era lá de muita conversa, nem de largos sorrisos. Aliás, como todos os pais daquela época. Não que fosse sisudo ou amargo. Mas, o silêncio e o peso do olhar faziam com que os filhos entendessem que era hora de parar e tomar tento, fosse o que fosse que estavam fazendo…

02. Era assim o ano todo num tempo em que homens andavam de chapéus e mulheres não fumavam em público. As pessoas — quase todas, acredite — almoçavam em casa e o grande perigo das ruas de São Paulo era atravessá-las cuidadosamente para não ser atropelado por um carro de praça (táxi) ou pelo bonde camarão.

03. Parece que foi há séculos. Mas, nem faz tanto tempo assim.

04. Quando chegava o fim de ano o pai se transformava. Desde novembro dobrava jornada de trabalho para reforçar o orçamento das festas. Trabalhava à noite como lixador numa oficina de manequins de gesso (desses que enfeitam as vitrines) e animava-se em fazer planos para a noite da véspera de Natal. Queria toda a família ao redor, incluindo sogros, cunhados, sobrinhos e agregados. Aos filhos, os presentes desejados e, para a paciente mulher (que me atura o ano todo, dizia), uma jóia mesmo que fosse apenas banhada a ouro… Mas, esses mimos só seriam descobertos na manhã do dia seguinte. Era uma praxe que o pai fazia questão de preservar…

05. A noite de Natal era a festa mais esperada do ano. O curioso é que, em meio a cantoria e a alegria de todos (especialmente da avó e do cunhado que entoavam cancionetas napolitanas), o pai sentava-se à cabeceira da mesa e lá ficava a observar silenciosamente o retrato do que hoje sei chamar-se felicidade…

06. Só por um momento, logo depois da meia-noite, pedia a atenção e puxava a oração que dizia assim: Menino Jesus, rogai por nós/ Que tanto e tanto precisamos de vós/ De vosso amparo/ De vossa luz/ De vossa orientação e proteção/ Para que possamos seguir sempre no caminho de Deus/ Da verdade, da justiça, do amor, da fraternidade, da felicidade plena para todos os homens/ Intercedei por nós, pelos nossos filhos, pelas pessoas que amamos e por aquelas que nos amam também/ Intercedei por todos nós/ Junto ao Deus Pai Todo Poderoso/ Ao Filho/ E ao Espírito Santo/ Intercedei por nós junto à Virgem Maria/ Aos anjos e a todos os santos/ Intercedei por nós/ Renovai nossa fé a cada manhã/ Protegei-nos de todos os males/ E abençoai-nos sempre… Amém.

07. Assim como a velha canção do Roberto que voltou para lembrar que todos estão surdos, a oração que meu pai me ensinou retornou à minha cabeça neste final de ano. O mundo anda mesmo por um triz. Os homens perdem a noção do que é fraternidade e do verdadeiro caminho que conduz à luz. Que projeta a vida. Que esparrama a felicidade plena para todos os homens.

08. Rezemos, pois, para que o sentimento de fraternidade e o renovar de esperanças tão comuns nesta época do ano se estendam pelos próximos doze meses, doze anos, doze décadas, séculos… E a almejada PAZ fique um pouco mais perto de nós. Feliz Ano Novo, caro leitor…

NR: Por problemas técnicos, a coluna Caro Leitor da edição de 21 de dezembro saiu truncada, prejudicando a compreensão do texto. Por isso, com a devida atualização, estamos refazendo sua publicação nesta semana

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