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Em nome do pai…

por Rodolfo Stipp Martino

Por que escolhi jornalismo?

De novo a pergunta que me fiz ao entregar a ficha de inscrição do vestibular, sem grande convicção da escolha.

A resposta veio em seguida.

Cenas da minha vida surgiram na mente como o desenrolar de um roteiro de filme.

Cena 1- Em uma mesa, o garoto escreve um texto para o colégio e, ao lado, o pai/jornalista batuca nas teclas de uma máquina de escrever a coluna para um jornal de São Paulo.

Cena 2- O goleiro adolescente entra na quadra Ginásio do Parque Antártica para defender as cores do seu time do coração, o Palmeiras.

Cena 3- O rapaz caminha pelos corredores do avião. Vai estudar em Perugia e passar uma temporada sozinho na terra dos bisavós, a Itália.

Outras imagens surgiram, todas a retratar momentos que foram importantes para mim. Cresci ao lado da família: a estudar, jogar futebol (até o juniores da Portuguesa), agora escrevendo e sempre aprendendo com a vida.

Muito prazer, sou Rodolfo Stipp Martino.
(Pra quem não me conhece, esclareço: sou filho do dono do sítio. E aqui estou a convite do próprio…)

Ser jornalista é continuação natural do filme narrado acima. Poder contar fatos que, de resto, nos transformam em privilegiado historiador do cotidiano. Retratar momentos importantes de pessoas e do País. Integrar a sociedade. E com seu trabalho transformá-la. Denunciar algo que está errado e ressaltar aquilo que está correto. Tudo isto é muito precioso para mim.

Quando entrei na faculdade, depois de um longo discurso, o professor falou algo que bateu lá no fundo, entre o fígado e alma: “O dia-a-dia dos repórteres é o principal pauteiro das redações”.

Um fato que presenciei (e que entendo ser uma das mais belas cenas do filme da minha vida) confirmou a fala do professor. Foi a primeira vez que me senti um repórter, uma testemunha do meu tempo.

Durante a Copa do Mundo de 1998, estava em Perugia, pequena cidade na região da Umbria. Aprendia uma nova língua na Università Per Stranieri, e morava em um apartamento com outros brasileiros: Davi, 24 anos, Evandro e Renato, 23, e Rafael, 17. Uma bandeira verde e amarela estendida na varanda provocava um misto de surpresa e curiosidade nos italianos. “Mas o que é isso?”, sempre implicava o dono e síndico do prédio, o senhor Barbarosa.

Nunca demos atenção e a bandeira permaneceu lá, impávida e altaneira, apesar da vitória dos franceses.

No dia da final, fomos todos para o centro da cidade. Havia três telões na praça principal. Lá encontramos outros brasileiros que moravam em Perugia e, motivados pela grande saudade do Brasil, estavam até mais entusiasmados do que nosso grupo. Rostos pintados, cornetas e bandeiras chamavam atenção. Uma festa. Como a Itália não estava na final, a torcida italiana estava dividida. Os simpatizantes da Inter, time do Ronaldinho, torciam para o Brasil e os da Juventus, do francês Zidane, vibravam pela França.

Quando surgiu na tela a escalação do Brasil, algo estava errado. O nome de Ronaldo não aparecia sequer entre os reservas. Ninguém entendeu. Nem os italianos, muito menos a gente. Mas, quando os times entraram em campo, Ronaldo estava lá e, com ele, a equipe brasileira afundou implacavelmente: 3×0.

Gostaria de poder relatar a sensação de fraternidade que bateu em todos os brasileiros. Voltamos juntos para nossas casas e, a cada um que se despedia, era um chororô diferente. Mas, a vida em Perugia continuou. Neste dia, a festa programada para nosso apartamento foi cancelada — ou melhor, adiada para os outros finais de semanas. Apesar da tristeza pela perda do título mundial e das broncas do senhor Barbarosa. “Parem com o barulho”, ralhava sempre.

Entendi o episódio como exemplo do que meu professor havia dito em sala de aula. Estava em férias e ver os jogos da Copa fez parte do meu dia-a-dia. Seria, penso eu, interessante contar o que sente, vibra e torce um brasileiro que está longe. O susto de ver um combalido Ronaldo em campo e imaginar o que de pior poderia acontecer ao ídolo de italianos e brasileiros.

Escrevi o texto mesmo sem ter onde publicar. Era necessários registrar todas aquelas emoções e depoimentos. Guardei a reportagem no meu computador – e fiquei especialmente feliz. E melhor: com a sensação do dever cumprido.

Como naquela ensolarada tarde de domingo, a vida continua. Outras copas vieram e virão. Quem sabe na próxima, eu faça uma reportagem sobre o mundial e, desta vez, haverá quem a publique. Certamente haverá muito do que vivi em Perugia e, por que não?, o remoto baticum da máquina do pai.

Enfim escolhi ser jornalista para poder contar o dia-a-dia de uma cidade, de um país, do mundo – esse mesmo que a gente transforma numa grande – e desafiadora – aldeia…

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