Sign up with your email address to be the first to know about new products, VIP offers, blog features & more.

Coração oriental

Há vinte anos, por essa época, eu andava pelo Jornal da Tarde a defender uns trocos com alguns frilas. Vida de repórter vira-lata não é tão simples e venturosa como pode parecer num primeiro momento.

Nessas e em outras, caiu em minhas mãos algumas pautas sobre os 80 anos da Imigração Japonesa no Brasil. Ao que parece, o jornal iria produzir um suplemento especial e lá fui eu para o consulado japonês – ou coisa que o valha – num prédio suntuoso na avenida Paulista. Passei nem lembro quantos dias – mais de semana – por ali a conversar, via intérprete, com quem aparecesse à minha frente, de sorriso gentil e olhinhos puxados.

Não sou capaz de lembrar as matérias que fiz. Mas, não devem ter sido lá grande coisa. No meio do trajeto, o tempo entre a reportagem e a publicação do tal caderno especial, houve uma reestruturação na redação do JT, mudaram inclusive os responsáveis pela edição dos textos. Resultado: não vi sequer uma das minhas matérias publicadas na íntegra. Um trecho aqui, outro ali a completar este ou aquele assunto.

Frustrante?

Nem tanto.

No dia aprazado, lá estava os troquinhos básicos na minha conta. Além do que, aquela vivência me trouxe outros ganhos Um deles, lembro-me bem – e conto a seguir.

Foi o depoimento emocionado de um ilustre diplomata japonês. Ele dizia invejar a vocação para alegria que tem os brasileiros em contraponto à rigidez da cultura japonesa.

A intérprete resolveu acrescentar um comentário à tradução:

— Acho que ele gostaria de ser um pouco brasileiro…

Não sei se vocês acreditam em milagres ou nessas coisas paranormais. Sei que, ao que consta, algum ‘santo’ poliglota baixou no japonesinho de terno impecável e gravata de seda. Parece que o jovem diplomata entendeu o que dizíamos e um pouco mais:

— Brashiirero, bom, né? Garantido mesmo. Mas, só um pouquinho, né?

Enquanto falava, olhava cumprido para a ‘preferência nacional’ da morena que veio nos servir o café e agora se encaminhava para a porta da sala, sem se dar conta que deixara em cacos um frágil coração oriental.

Verified by ExactMetrics