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Divagações sobre o chute do Baggio, 15 anos depois

Vou lhes contar de uma cisma antiga.

Que, por sinal, retornou dia desses, em julho; por ocasião das reportagens comemorativas dos 15 anos da conquista, pelos brasileiros, da Copa de 94.

A bem da verdade, ainda hoje se discute o tetracampeonato de futebol conquistadopela seleção do capitão Dunga, de Romário, Bebeto, Zinho, Parreira e Cia.

II.

Há os que relutam em reconhecer o feito.

Mas, não seguem essa linha minhas inquietações.

Na boa.

Cada um, cada um.

Uma coisa é uma coisa.

Outra coisa é farelo – e vento e o tempo levam.

No Planeta Bola, vence o melhor – e ponto.

Não lamento a seleção de 82.

Nem sapateio pela de 94.

Só que uma perdeu, a outra ganhou.

Sem jurumelas.

III.

Como já ameacei dizer e não disse, a angústia supracitada por este desenxabido escriba é ver e rever – como aconteceu semanas atrás – a cena do Baggio, o craque da Azurra, a desperdiçar aquele pênalti.

Vivamos aquele momento, quadro a quadro:

A elegância na breve corrida.

O meneio para ajeitar o corpo e impulsionar o arremate.

O brevíssimo instante que antecede a definição da cobrança. Quando o mundo pára e as almas se enlevam para sorrir ou chorar.

O goleiro intui, e se atira à própria sorte.

O cobrador perde a visão, tudo escurece por um átimo de segundo.

Coração a batucar descompassado.

O chute.

A definição e as consequências.

IV.

O destino, então, se faz em urros de alegria e, de outro lado, de desespero.

Só aí Baggio recobra os sentidos.

As mãos se apóiam ao quadril.

Os olhos vagam, como a bola, para o infinito das desilusões.

A vida nas alturas.

V.

Ele abaixa a cabeça.

E conclui:

Não há explicação para o sonho que acabou de acabar.

VI.

Quantas vezes já nos sentimos assim – um nada – diante dos desígnios da vida e do tempo?

VII.

Não sei por qual motivo falei deste assunto com uma amiga,

Falei por falar. Mais para desabafar mesmo.

Vejam o que ela me respondeu:

— Há quem diga que somos nós quem fazemos o nosso destino, não sei. Acho que sim. Há algo no inconsciente que é muito forte. Os conflitos com o tempo vêm desde a origem do pensamento na filosofia (quem sabe até bem antes). Em V antes de Cristo, no período pré-socrático, dois filósofos quebraram a cabeça para definir o tempo e seus desígnios. Parmênides era radical, dizia que ser é ser e não ser é não ser. Agora o Heráclito é autor daquela célebre frase ninguém se banha no mesmo rio duas vezes. Ou seja, tudo muda… No meio do radicalismo de um e do etéreo do outro, veio Platão. Para ele, o tempo é a imagem da eternidade em movimento. Dizia que o tempo no inconsciente nunca é linear agora essa coisa da cronologia, da razão é do consciente. No inconsciente fica o imutável. Coisas que vamos registrando e nunca se apagam da nossa memória. Tudo isso explica o chute torto do rapaz. Desconfio que já habitavam seu inconsciente.Foram tão fortes que conscientemente… Ai quanta enrolação. Do que falávamos mesmo?

VIII.

Confesso.

Eu me senti o próprio Baggio a olhar desesperançado o infinito.

Depois reclamam quando digo que mulher e futebol não combinam…

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