O pai se foi numa quarta, dia 1º de setembro.
Há dez anos.
Sentiu-se mal de madrugada. Preferiu não me acordar.
Disse para mãe que agüentaria o tranco.
Que esperasse o dia clarear para me chamar.
Pouco antes das seis, o telefone tocou.
Sabia que o pai não andava bem. Ia e voltava ao Incor há algumas semanas.
Os médicos apenas contemporizavam. Recomendavam cuidados e rigores que o pai obedecia lá do jeito dele.
Me chamaram, certa vez, para dizer que ele não resistiria a uma nova operação.
(O pai temia fazer outra cirurgia. Só de pensar no cateterismo empalidecia, suava frio, perdia o habitual sorriso sereno.)
Por isso o tratamento era esse mesmo – e ponto.
Não podia falar ao Velho da situação sem volta.
Seria um duro golpe.
Mas, toda vez que precisávamos ir ao Incor, ele receava a internação.
Eu tentava tranqüilizá-lo. Dizia que logo estaríamos de volta.
E ele voltaria a bater o ponto, com os velhos amigos, na padaria perto do apartamento onde morava.
Em resposta, ele ajeitava aquele sorriso sereno no rosto.
Vida que segue.
Naquela manhã, não foi bem assim.
Estávamos no fim da Avenida Paulista. O carro começava a entrar na passagem subterrânea que leva a Doutor Arnaldo, quando pai me olhou, respirou fundo e deixou a cabeça tombar no banco do passageiro.
Segurei sua mão.
E assim chegamos ao hospital um minuto depois.
Não houve a sonhada volta.
Desde então busco a serenidade do sorriso do Velho a cada nova manhã.
Sei que esta bênção nunca me faltará.
* FOTO no blog: Jô Rabelo