Havia um ritual entre os garotos da rua Muniz de Souza.
Enquanto não chegasse a rainha das nossas tardes – uma pesada bola de capotão – valia qualquer coisa que se assemelhasse a ela para nos entreter – e, por que não?, nos encantar.
Para animar os rachões, poderia ser uma bola de meia ou de borracha (o terror das vidraças das casas vizinhas). Poderia ser uma esfera de desenhos coloridos ou até mesmo tampinhas de refrigerantes ou cervejas que recolhíamos no vão da sarjeta.
Queríamos mesmo era nos esfalfar de jogar futebol.
Era isso o que valia…
Quando lá pelas quatro ou cinco da tarde, alguém aparecesse com a bola de capotão – preferencialmente a oficial, também conhecida como número 5 – aí o bicho pegava mesmo. Partíamos para o Jardim da Aclimação, onde improvisamos um campo no barranco atrás Estádio Distrital.
Era a nossa Copa do Mundo.
A turma da Muniz contra a turma da (rua) Piaí. Quem ganhasse enfrentava a turma da (rua) Albino Barbosa. O vencedor jogava com a turma da Barroca (que era uma quebrada lá para os lados da rua Robertson) e assim íamos até que desse a hora da Ave Maria e o breu da noite encobrisse nosso campinho e nossos sonhos de moleque.
Diga-se que mesmo a nobre redonda de couro marrom alaranjado, quando chegava aos nossos pés delirantes, já tinha um bom tempo de uso. Vez ou outra, muito raramente, um dos nossos aparecia com uma bola novinha, novinha.
Ficávamos felizes com as sobras dos times varzeanos da região.
(Diga-se que inclusive os fardamentos dos times infantis e juvenis eram herdados dos adultos que, diga-se, nos chegavam em frangalhos.)
Como disse, queríamos mesmo é jogar futebol.
Bons e saudosos tempos, aqueles.
Nos últimos dias, o noticiário da Copa tem como estrela máxima os queixumes dos boleiros sobre a bola da Copa, que até nome tem.
Ninguém gostou da tal Jabulani.
Aliás, por iniciativa própria – e algo descabida para um senhor da minha idade – fui conhecê-la em uma loja de artigos esportivos num shopping perto de casa.
Dei-lhe algumas petecadas para ver como reagia. Causei certo espanto nos atendentes que não ousaram me interromper. E, confesso, achei a ‘mocinha’ uma graça. Colorida e arisca, como manda o rico figurino dos dias atuais.
Olhei também para a prateleira ao lado; repleta de chuteiras, dos mais diversos modelos e cores.
Achei toda aquela parafernália supimpa de fazer inveja a qualquer pavão.
Mesmo os mais misteriosos…
Ah! Que estou eu a dizer!
Pavões não chutam bola, nem calçam chuteiras.
** FOTO NO BLOG: Camila Bevilacqua