Nem bem cheguei à Redação quando recebi o recado de que o big boss queria falar comigo.
Papo cavernoso, anunciaram os arautos da desgraça alheia.
E me prepararam para a árdua missão:
— O homem não gostou nada da coluna do Fulano. Não concorda como o que ele escreveu – e quer demiti-lo a qualquer preço.
Eu era diretor de Jornalismo da casa – e ele queria me dar ciência da decisão.
Senti o tamanho da encrenca, mas não havia alternativa.
Lá fui eu encarar o diretor presidente, mais conhecido como dono de tudo.
Ao entrar na sala, lembrei a máxima que o grande Nasci sempre nos ensinou:
— Seja qual for o embate, nunca se precipite. Deixe a ansiedade para o outro, ele que diga a que veio.
Foi o que eu fiz.
Disse bom-dia, me aboletei na poltrona de coro – e esperei a bronca. Que era mais um desabafo, e não tardou:
— Não gosto da coluna do Fulano etc etc etc…
E concluiu, com o importante veredicto:
— Vamos demiti-lo.
Era uma pendenga mais pessoal do que propriamente jornalística. Fulano era um bom jornalista, tinha um texto ágil, conseguia informações de primeira e, via a coluna do jornal, alcançara um belo prestígio nos diversos segmentos em que atuava. Prestígio que o preclaro diretor presidente perseguia, mas estava longe de alcançar.
Foi o que disse a ele, excetuando-se, lógico, a primeira e a última frase.
Ele repetiu que não gostava da coluna, o jornal era dele – e ponto.
De minha parte, também repeti os argumentos, floreei um tantinho mais, acrescentei que o jornal perderia com a demissão e poderíamos dar munição aos concorrentes e cousa e lousa e maripo(u)as, como diria o saudoso Plínio Marcos.
Acho que o boss se encheu do meu papo – e resolveu encerrar o assunto.
— Faça o que quiser. Mas, lembre-se, eu não gosto dessa coluna, menos ainda do colunista.
Na sexta-feira, a nova edição estava nas ruas e, mal cheguei à Redação, recebo outro recado do chefão.
— Quer falar comigo?, perguntei.
E ele com o jornal na mão, aberto na página da coluna do Fulano:
— Não falei para dispensar esse cidadão?
E eu, na minha:
— Disse para que eu fizesse o que quisesse…
O homem começou a cantilena que não gostava da coluna, do colunista e… Até que caiu em si, começou a rir e pôs fim à questão:
— Você é teimoso mesmo. Vai lá, vai… Vai trabalhar que a gente ganha mais. Depois a gente volta a conversar.
E nunca mais tocamos no assunto.
Lembrei-me dessa história ao ouvir as explicações de Dorival Júnior sobre o episódio que marcou sua lamentável saída da direção técnica do Santos. Respirei aliviado que, naquela longínqua manhã, estávamos a sós na sala da presidência. Se houvesse outros diretores a palpitarem de acordo com o interesse de cada um dos departamentos, talvez Fulano fosse mesmo demitido – ele e eu.
** FOTO NO BLOG: Camila Bevilacqua