Eu a escolhi.
Entre tantas e tamanhas que se espalhavam pelas areias da praia deserta da pequena San Simon naquela manhã primaveril e ensolarada, no litoral da Califórnia.
Quando a recolhi do chão, me pus a imaginar por quantos anos ela rolou pelo fundo do fundo do Oceano Pacífico até chegar ali, naquele silencioso canto do mundo (se é que fez essa trajetória?).
Cinza, rústica, chapada, imprecisamente circular. Encaixou-se perfeitamente na palma da minha mão, quando a aperto com os dedos, cerrando o punho.
Tive vontade de atira-la de volta ao marzão encapelado que se dispunha à minha frente. Caminhava sem destino pela praia, aguardando a hora de voltar ao hotel e retomar a estrada.
Inexplicável sensação de bem-estar que me toma nesses momentos ocos das viagens em que se pára em lugar qualquer sem prévio aviso, apenas por parar, porque “o corpo pede um pouco mais de calma”, como escreveu Lenine.
Nessas horas, algumas lembranças nos afloram. É como ver estrelas, pequenas e intangíveis estrelas tão distantes, tão reais…
Ali, me vi menino de tudo, diante do lago da Aclimação, a lançar pedras na vã ambição de que as tais chapeassem as águas duas, três, quatro vezes. Um feito, quando conseguia.
Como naqueles idos, o tempo pareceu parar, mágica e generosamente. Outras amorosas recordações se enfeixaram naquele momento de paz e inexplicável plenitude, como há muito não vivenciava.
Mesmo que, por instantes, troquei o cético pelo sonhador – e acreditei.
Segurei o impulso de jogar a pedra ao mar, e a depositei no bolso do moleton, sem me dar conta do que fazia.
De volta ao Brasil, surpreso, eu a encontrei quando desfiz a mala.
Foi ótimo vê-la ali. Que belo reencontro.
Transformou-se em “recuerdo” que enfeita a estante diante da pilha de livros que ainda não li.
(Um dia, vou ler, juro…)
Um amigo quando a viu, e sob meu enciumado olhar, a acaricou, disse com pose de entendido: “é calcário”.
E eu lhe contei a história que lhes conto agora.
É uma graça que recebi, concluí.
– Então quer dizer que é alguma ‘Greice’… – disse ele, ironico, carregando no inglês, com ares desconfiados de quem não se contentou apenas com aquela parte da história.
*Post de número 1998