Uma jovem repórter me procurou na sexta-feira para falar de Agostinho dos Santos, grande cantor brasileiro dos anos 50 e 60, que morreu em julho de 1973 em um desastre quando o avião em que viajava estava pousando no aeroporto de Paris.
A jornalista está desenvolvendo uma pauta sobre bares temáticos e descobriu, meio que por acaso, na região do ABC, um estabelecimento que reverencia a memória do artista. Pertence a uma das filhas de Agostinho – e ela (a repórter) ficou intrigada com a relevância da obra do cantor, ressaltada na conversa com a saudosa filha:
– Ele era tudo isso, professor?
Antes que eu respondesse, a jovem me disse que foi ao Google –e lá encontrou as músicas de Agostinho e informações básicas sobre sua carreira. Que ele foi um cantor de sucesso. Umm dos primeiros a gravar músicas de Tom Jobim e Dolores Duran, antes mesmo que estes fossem famosos e reconhecidos. Que transitou por diversos ritmos, inclusive a versão de boleros famosos (como “Aqueles Olhos Verdes” e “Noites de Ronda”, além deum roquizinho esdrúxulo chamado “Até
Logo, Jacaré” – e foi um dos precursores da bossa nova.
Tem razão a moça de não se satisfazer com essas breves e insossas linhas.
Não refletem a grandeza de Agostinho.
Ele foi um dos responsáveis pela mudança de toda uma estética sonora da época. Preferia encaixar a voz, com precisão, entre os acordes, de forma elegante e
sensível ao invés de soltar o vozeirão, a estourar os tímpanos dos ouvintes, como faziam os cantores da época. Viveu a Era de Ouro do rádio, participou de diversos filmes (era comum cantores apresentarem seus sucessos nas produções nacionais) e dos primeiros musicais da TV brasileira.
Era figurinha fácil nos célebres Clube dos Artistas e Almoço das Estrelas,
comandados por Airton e Lolita Rodrigues, na TV Tupi. Vira e mexe, emplacava a música campeã da semana, no programa Astros do Disco, apresentado por Randal Juliano, na TV Record.
Eram outros tempos, sem dúvida.
Para a crítica especializada, o grande momento de Agostinho está como intérprete da trilha do filme “Orfeu de Carnaval”, de Marcel Camus. São definitivas – e impecáveis – as leituras que faz para “A Felicidade” (Jobim/Vinícius) e “Manhã de Carnaval” (Luiz Bonfá). Também é bastante exaltada sua participasção no Festival de Bossa Nova, histórico, que aconteceu no Carnegie Hall, em Nova York, em 1962.
Eu, particularmente, prefiro o Agostinho dos Santos cantor sambas-canções como a belíssima “Nossos Momentos” (Haroldo Barbosa/Luis Reis), entre outros. Gosto também de ouvir histórias sobre a generosidade de Agostinho como descobridor e/ou incentivador de novos talentos – incluam-se Elis e Milton Nascimento nesse rol. E sobre as peripécias na noite paulistana de então (ele era o que se dizia à época um ‘habituê’) e de sua habilidade como zagueiro, defendendo as cores do Sereno Futebol Clube, time de várzea da Bela Vista.
Falei e escrevi demais. Mesmo assim, tenho certeza, não fiz jus ao talento do saudoso Agostinho dos Santos.