Acompanho com tristeza a notícia do fechamento ao público do Museu do Ipiranga por tempo indeterminado para reformas emergenciais. Tenho um apreço mais do que especial por este monumento da nossa História e suas cercanias, o Parque da Independência. Trabalhei por mais de 20 anos na região e desenvolvi minha dissertação de mestrado sobre o “espaço lúdico” de conquistas, aprendizagem e incentivo à ciência em que se transformou a Instituição, de maio de 1994 a dezembro de 1999, quando o professor José Sebastião Witter ocupou a direção e promoveu uma ampla reforma, orçado em nove milhões de dólares.
II.
Disse à época que pretendia “enfocar uma página especialmente feliz da nossa História: o resgate da imagem centenária do Museu do Ipiranga, como é popularmente conhecido”.
E mais: mostrar como a instituição se projetou, viva e participativa, na virada para o Terceiro Milênio.
III.
Explico o motivo.
O professor chegou para reerguer o combalido prédio do Museu Paulista da Universidade de São Paulo que vivia um período de ostracismo e abandono.
Havia a agravante de ter o seu maior patrimônio (que é o próprio prédio) dilapidado pela devastadora ação do tempo, pela confusa distribuição de responsabilidades no Parque da Independência onde se localiza (há um confronto de poderes entre União, Estado e Município) e pelos resquícios do desmantelamento causado pelo fim do grandiloqüente Espetáculo de Luz e Som, que fez apologia do regime militar em 1972, ano do sesquicentenário da Independência.
IV.
Witter, corajosamente, começou a hercúlea tarefa com a aproximação dos diversos segmentos da sociedade que se relacionavam com a Instituição – a Universidade, o bairro do Ipiranga, as autoridades de todas as instâncias, a Federação das Indústrias e Comércio, as escolas da região, os veículos de comunicação – todos imbuídos do mesmo e louvável objetivo reerguer o principal cartão postal da cidade.
V.
Por isso, foi tocante acompanhar a emoção do professor José Sebastião Witter na primeira semana de dezembro de 1999. Ele se despedia do cargo de diretor do Museu do Ipiranga, por obra e graça de alguns trâmites burocráticos que o obrigaram a se aposentar, após 48 anos de vida acadêmica, dentro da USP. Uma série de eventos marcou aqueles dias que incluiu a posse da nova diretora, Raquel Glezer, um jantar em sua homenagem organizado pelas lideranças locais e a inauguração da majestosa iluminação externa do centenário prédio do Museu, seu último ato como diretor.
VI.
Todos esses momentos, a bem da verdade, surpreenderam esse paulista com olhos de menino espantado, como a ver o mar pela primeira vez.
O Museu estava impecável, altivo e solene. Prestes a completar 113 anos de existência, era o segundo mais visitado de todo o País.
“Foi o coroamento da minha carreira na USP”, confessaria mais tarde.
VII.
Lamento que a obra do amigo Witter não teve prosseguimento.
Aliás, são raros os acadêmicos como prof. Witter que entende o essencial: todas as pesquisas e todos os procedimentos da Universidade só fazem sentido quando ultrapassam os muros da Instituição. Vão bem mais além. Quando dialogam e atuam para transformar a sociedade.