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Nem Jesus salva o Palmeiras

Já entrado nos 70 e poucos, Sr. Jesus é um dos mais queridos da academia aqui, perto de casa. Todas as manhãs, o aposentado do Tribunal de Contas mostra do que é capaz quando se está decidido a vencer os rigores do tempo, aquele que para no porto, não apita na curva, não espera ninguém.

É um exemplo de dedicação para a garotada que o saúda como se fosse um dos iguais.

“Boa, Jê, manda ver nos abdominais.”

“Vamos puxar uns ferros, agora?”

Com a mulherada, o sucesso é idêntico. Inclusive na faixa “da melhor idade”, há quem diga, duas viuvinhas recentes arrastam uma asa daquelas para o vovô saradão.

Quando comentam o assunto, Sr. Jesus sorri desconfortável. Faz questão de esclarecer sua situação de avô, pai e maridão fiel prestes a fazer 50 anos de casado, “e bem casado”.

“Não brinquem com essas coisas, meninos. Alguém pode sair magoado.”

II,

Único senão na bela rotina do Sr. Jesus é o fato de o homem, mesmo com o santo nome, é palmeirense – e não faz milagres.

Como disse lá em cima, a turma da academia é parceiraça dele. Vale para os elogios e a acolhida. Vale para a gozação, implacável, quando o seu time do
coração perde – e como perde o seu time do coração!

Jesus está desolado. Justo no ano centenário do Palestra, ele não se lembra de assistir a tantas e tamanhas derrotas do seu Verdão que virou Verdinho e agora só faz deixá-lo verde, mas é de raiva e vergonha.

Nem a inauguração da nova arena o animou. Preferiu conhecê-la no show do seu contemporâneo Paul McCartney. Na estreia contra o Sport, nem pensou em ir.

“Sabia que seria uma festa linda, mas que, ao final, estaríamos chorando m ais uma derrota.”

III.

No sábado à noite, na hora do jogo contra o Inter, Jesus resolveu não correr o risco de presenciar mais uma derrota que, sabia de antemão, seria inevitável.

Como não gosta de ‘cornetar’ técnico, jogador dirigente e mesmo o juiz, preferiu programar-se para assistir ao show Estrelas da Patinação, com campeões olímpicos se apresentando no Ginásio do Ibirapuera.

Foi uma fuga estratégica, reconhece. Iria se abstrair do jogo; afinal, ninguém gosta de sofrer.

Foi o que fez.

Saiu encantado do espetáculo. Música de primeira, coreografias singulares, saltos e piruetas que o deixaram por demais feliz.

“Quanta leveza, quanta elegância”.

Há tempos não se sentia assim, de bem com a vida. Especialmente quando saía dos campos de futebol. Lembrou a Copa do Mundo, as viagens com a esposa para ver os jogos do Brasil e a decepção…

IV.

Nessa hora, e antes mesmo de saber do fracasso no Beira-Rio, Jesus decidiu se dar férias do chamado Esporte Bretão. Não seria mais palmeirense – ufa! Que alívio!. Não torceria para time algum, nem para a seleção.

“O futebol já deu o que tinha que dar” – concluiu.

Resolveu que faria o anúncio hoje pela manhã, assim que a turma estivesse reunida na academia.

Inclusive, preparou um breve discurso para anunciar a decisão.

“Como nem Jesus, o legítimo Filho do Homem, salva o Palmeiras, não seria este outro Jesus, humilde servo do Senhor, que resolveria esse tosco impasse. Por isso, garotada, estou livre para shows, teatros, cinema e… baladas. Mas, com todo o respeito, que minha senhora vai junto.

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