Dia sim, e outro também, chegavam juntos ao estacionamento da empresa em que trabalhavam (e ainda trabalham).
Bernardo notou a coincidência – e também o quanto a moça era jeitosa.
Sabia vagamente o nome dela – Talita. Já haviam se encontrado em algumas reuniões, trocado cumprimentos pelos corredores, mas conhecer, conhecer, não se conheciam.
II.
Bernardo começou a gostar da brincadeira.
Tanto que a primeira coisa que fazia ao passar pelo controle de acesso à grande praça do estacionamento era procurar pelo carro dela.
Quando não o encontrava, pacientemente aguardava que chegasse. Para deliciar-se ao vê-la descer, trancar o veículo, e descer rumo ao prédio em que trabalhava, equilibrando-se no salto, mas sempre elegante, sempre bela.
Só depois ia tratar da vida, e dar início ao expediente do dia.
Trabalhavam em prédios distintos. Por isso – e porque no fundo, no fundo, era um tímido – nem lhe passava pela cabeça forçar uma aproximação.
Sabe-se lá o que ela pensaria, como reagiria.
III.
Para ser sincero, (in)certa manhã, teve o impulso e foi acompanhá-la.
Teve uma boa e uma má notícia.
A boa:
Ela não usava mais o anel de compromisso na mão direita.
(Nem na esquerda, ufa!)
A ruim:
Tudo o que conseguiu foi um “olá”, acompanhado de um punhado de indiferença, caracterizado pelo passo mais apressado que aumentou a distância entre os dois.
IV.
Agora, preferia continuar assim.
Ele a acompanharia anônima e discretamente todos as manhã (exceto sábados e domingos, claro) e já se sentiria feliz só pelo deleite de vê-la passar.
Leu, não sabe bem onde, que amar é verbo intransitivo.
Era um romântico. Um sensível.
Bernardo, o fantasista.
V.
Fantasista?
Pois, sim…
Todas essas lembranças povoavam a imaginação de Bernardo enquanto uma luz avermelhada invadia o quarto pelas frestas da janela. Iluminava o corpo nu de Talita, ao seu lado, a dormir o sonho das musas, das bem-amadas.
Seria um lindo dia. Que tardou, mas chegou…