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Times do coração: Palmeiras, Huracan e América

Sempre fui palmeirense – e é só e me basta.

Tenho um carinho especial pelo Huracan da Argentina porque o meu cunhado, o saudoso Waltinho, era craque do Huracan da Várzea do Glicério que, segundo se comentava à época, era uma “filial” do time portenho. Pode ser que sim, pode ser que não. Uns diziam que os gringos estiveram, em excursão, por São Paulo e, mais do que qualquer apresentação, o lindíssimo uniforme serviu de inspiração para os boleiros do Cambuci na fundação do novo clube.

Acho mais provável essa versão.

O time tinha o mais belo fardamento que já vi: camisas grenás, calções pretos e meiões cinzas. O distintivo era um desses balões com a letra H sobressalente.

Aos meus olhos de garoto, era um encantamento.

Aos 16, 17 anos, cheguei a jogar no segundinho do Huracan. Mas, não fiz lá grande carreira. O bom mesmo era o Waltinho, vulgo solado, lateral esquerdo de inesquecível talento.

Ele sempre me dizia:

“Só não fui profissional porque era arrimo de família. Perdi meu pai muito cedo”.

Era a mais pura verdade.

Naquele tempo, a São Paulo dos anos 50, ou se trabalhava ou se jogava futebol…

Conto essa história para embicar a segunda – a bem da verdade, o motivo da crônica de hoje.

Soube ontem que o América está de volta à elite do futebol carioca.

Fiquei feliz com a boa nova.

Não sou assim um José Trajano, americano de fina estirpe, mas tenho uma simpatia especial por este clube, desde garoto.

Como disse era (e sou) palmeirense – e só e me basta.

Mas, era moda, para a molecada daqueles idos, torcer por um time no Rio de Janeiro. Todos os anos o Torneio Rio/São Paulo açodava essa rivalidade pelas quebradas do Cambuci. Ainda mais que nós, os sub 12, acreditem!, podíamos assistir aos jogos de graça no Pacaembu, desde que estivéssemos acompanhados por um adulto.

Então, fossem quais fossem, os clubes que se enfrentassem lá estávamos nós.

Havia uma equivalência de clubes para você torcer. Quem era Corinthians aqui torcia para o Flamengo lá. Os sãopaulinos eram tricolores tal e qual o Fluminense. O Santos de Pelé correspondia ao Botafogo de Garrincha. Nós, palmeirenses, ficávamos assim numa dúvida cruel. Poderíamos torcer pelo Vasco “que também era um time de colônia”, que era o que eu pai dizia.

Dizia mais:

– Ou para o Fluminense que tem as cores da bandeira da Itália.

Nenhum deles me convencia, embora o Fluminense tivesse o goleiro Castilho como grande ídolo. Ademais o Vasco era tão lusitano quanto a nossa aguerrida Portuguesa de Desportos.

Estava difícil escolher.

O pai tentou me ajudar na escolha.

Foi ao Rio para assistir a um Grande Prêmio Brasil do turfe e, de lá, me trouxe um chaveirinho com o distintivo do Flu.

– Logo você vai ter a chave de casa, então…

O Velho Aldo era brincalhão, eu tinha nove, dez anos.

A mãe ficava horrorizada, com a liberdade que ele dava ao “caçula” da família.

O pai me defendia com o jargão da época:

– Ele é homem, chacoalha a calça e está tudo resolvido.

Mesmo assim, eu ainda não estava convencido em torcer pelo Flu. O Roberto, um amigo sãopaulino da rua Muniz de Souza, já era tricolor também no Rio.

Não gostava dessa ideia.

Certa vez, um amigo do pai, o Judeu, levou dois ou três garotos ao Pacaembu assistir ao jogo Corinthians e América, pelo Rio São Paulo. O homem levou a gente para a numerada e, de lá, presenciamos maravilhados um festival de gols. Não lembro quanto foi, mas foram muitos. Acho que 6 a 5 ou 5 a 4, sei lá.

O Corinthians venceu.

O notável foi que, a certa altura da partida, eu me vi surpreendentemente torcendo adoidado pelos cariocas. Pelo goleiro Ari, e pelo ponta esquerda Nilo (que mais tarde jogou no Palmeiras).

Saí do estádio triste, mas convencido a ser América no Rio.

Cheguei em casa fui direto conferir no meu álbum de figurinhas – e a simpatia se consolidou.

Era um time verdadeiramente poderoso. Além do goleiro Ari, do Nilo, havia Djalma Dias (o melhor zagueiro que vi jogar), Amaro, Calazans, um lateral direito chamado Jorge e Quarentinha, centro-avante goleador. Um timaço campeão carioca de 60.

Esse título, confesso, ajudou a me conquistar.

Um capítulo à parte nessa historinha de infância: o goleiro Pompéia que revezava com Ari a titularidade do time americano. Só o conhecia por figurinha ou por imagens do Canal 100. Mas, a narrativa de seus feitos povoava minha imaginação de garoto apaixonado por futebol.

Acontece que um dos ídolos da molecada era o Manolo, espanhol atarracado que devia ter aí seus 20 anos e era goleiro de um dos times de maior prestígio no Cambuci, o República Futebol Clube, voltou de uma viagem ao Rio falando barbaridades do goleiro do América.

Imagino que tenha visto algum jogo por lá.

Que o Pompéia era melhor que o Gilmar, que o Castilho, que o Ari; o melhor do Brasil. Que saltava feito um gato, fazia ‘pontes’ inimagináveis, e até numa simples atrasada de bola do zagueiro (naquele tempo, podia) fazia uma das suas peripécias. Deixava a bola passar no vão das pernas para, em seguida, saltar para trás e encaixar a bola.

Levava a torcida ao delírio!

Um parênteses:

Naquele tempo, vou lhes explicar: nós adorávamos jogar futebol e a suprema honra que podíamos almejar era jogar no principal de uma das poderosas equipes varzeanas do Cambuci: o Santos, o República, o Triângulo, o Huracan, o Mocidade do Glicério, o São Luiz e outros tantos.

Jogar em uma equipe profissional era um sonho longínquo.

Ser o bambambam da várzea já estava de bom tamanho.

Por isso, o Manolo tinha toda a credibilidade do mundo.

Eu fiquei impressionado – e passei a me imaginar o Pompéia nas ‘peladas’ do campinho da rua Piaí e do ‘barrancão’ do Jardim da Aclimação. Aja joelho, aja cotovelos ralados.

Engraçado lembrar tudo isso agora…

O tempo passou, virei um zagueirão esforçado, um torcedor sempre apaixonado pelo Palmeiras, esqueci essas coisas da meninice. Mas, sempre que ouço falar do Huracan (que disputou a Libertadores este ano) e do Ameriquinha, me emociono e é inevitável lembrar a canção do grande Ataulfo Alves:

“Eu era feliz, e não sabia”.

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