Nunca soubemos seu nome verdadeiro.
Aliás, naquele boteco que desapareceu para a construção da portentosa Estação Sacomã do Metrô, não sabíamos quase nada de ninguém. Do Snoopy, menos ainda,
Snoopy era assim que o chamávamos; nós, os tronchos e os desvalidos que habitavam o local, dia sim e outro também.
Para pertencer a tal confraria, não era preciso muito. O cara deveria resistir à meia-dúzia de tragos, não dar vexames e, sempre que possível e quando invocado pela turma, ser um bom contador de histórias.
E o cara ia bem em todos os itens. Mas, gostávamos mesmo dos seus causos que, inevitavelmente, envolvia celebridades, artistas e nomes da alta roda paulistana.
Snoopy não dava pinta de ser durango, como quase todos ali. Achávamos que era empresário ou algo do gênero. Não ostentava, vestia-se com rigor, mas sobriamente; mas, pelas conversas, identificávamos suas origens, digamos, nababescas.
Em idade, ele se aproximava do Nasci – um tanto mais velho que nós.
– O cara é um aristocrata – disse certa vez o Ferrugem, outro coroa do lugar, e completou:
– Aposto que vive de herança da família.
Não assinamos embaixo, mas também não discordamos.
Gostávamos mesmo de suas histórias apimentadas, do quem pegou quem, dos bastidores e dos rumos desse mundo que não frequentávamos.
Homem também adora uma conversa fiada, uma fofoca. Se tem mulher bonita na trama, então; a coisa ferve.
Snoopy não era assíduo como nós, mas marcava presença – e era sempre bem-vindo.
De quando em quando, em dias de maior inspiração, o homem não deixava ninguém se coçar e pagava a conta, com direito à saideira.
Assim como chegou ao antro, Snoopy desapareceu. Alguns se deram conta, outros sentiram sua falta (queriam saber coisinhas dessa ou daquela Fulana), mas ninguém fez drama.
(amanhã continua)