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O reino encantado

Casa de mãe
tem café pronto e quente
e bom; chegue-se
a hora que chegar…

Tem sofá
em que se pode deitar
e se largar, como
se nada mais houvesse…

E há?

Casa de mãe
tem álbum de família;
o pai de camisa xadrez,
cabelos pretos e
jeito maroto…

Tem fotos dos netos
em porta-retrato de madeira
sobre a estante da sala;
toalha de crochê sobre a mesa
e relógio torto na parede…

“Arruma aí, filho,
que assim dá azar…”

Casa de mãe
tem perfume de alfazema,
réstia de sol,
cortina esvoaçante…

Tem conversa fiada;
notícias frescas
dos parentes distantes
e as últimas dos artistas
de TV, que ainda chegam
pelas ondas do rádio AM…

“Sabe, Carlos, que
o Faustão tem a sua idade?”

Casa de mãe
tem um canto que virou altar.
Tem imagens de santos
que os filhos lhe deram
e a foto do saudoso pai,
fincado na moldura
do Sagrado Coração…

Quando era menino,
o quadro ficava na parede
da sala do antigo casarão.
À sua frente, o pai fazia
três vezes o sinal da cruz
antes de sair. O menino ficava
impressionado: os olhos do Cristo
o acompanhava fosse onde fosse.

Ainda hoje é assim…

É a vez dele, homem feito,
prostrar-se ali à espera
da benção da mãe…

“Eu lhe abençôo, filho.
Que o Sagrado Coração
lhe vigie, guie e guarde."

Amém…

*Escrevi esse texto em 24 de maio de 2008; replico hoje, pois faz um ano que a mãe se foi… E o reino encantado agora só existe nas minhas lembranças…

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