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O Poeta e o Almeidinha

Lembrei ontem o Almeidinha e a velha Redação de piso assoalhado e grandes janelões para a rua Bom Passtor. Foi um tempo que não me sai da memória e que retratei no livro “Meus Caros Amigos – Crônicas sobre jornalistas, boêmios e paixões”, lançado em 2010.

Inclusive ilustrei o post de ontem com a capa do livro.O que despertou, desconfio, um (in)certo ciuminho no amigo Poeta que não se viu “representado” na coletânea (culpa minha, nada escrevi sobre ele) e a crônica “Almeidinha e Mano Menezes” não lhe desceu redonda.

– Você forçou a barra ao juntar a patetice de um e de outro, acusou-me o amigo. – Sobre o livro, você (eu) sabe, eu o acho bastante incompleto ao tentar fazer um registro daquela época.

Aceito de bom grado as críticas do amigo. Sequer discuto ou tento contra-argumentar. Afinal, é meu amigo…Um dos raros que me restaram daqueles idos…

II.

O Poeta era um dos nossos, embora não fosse jornalista e não trabalhasse na Redação. Não era o único infiltrado. Havia vários, de diversos segmentos sociais. Até porque o Sujinho onde nos encontrávamos, dia sim e outro também, era talqualmente aquele verso dos Tribalistas, lembram?

“Eu sou de todo mundo
E todo mundo é meu também”.

Ficava ali, onde está a portentosa Estação Sacomã do Metro. Mais exatamente na esquina da ruas Bom Pastor com Greenfeld, onde o Sacomã torce o rabo e o ônibus Fábrica/Pinheiro range e bufa ao fazer a curva.

Será que esta linha ainda existe?

III.

Não me recordo bem. Mas acho que o Poeta ainda guarda uma diferença com o Almeidinha.

Talvez fosse isso – e explico a razão.

O Poeta, como o próprio apelido sugere, sempre foi chegado a poemas, sonetos, literatices e afins. E gostaria muito de ver parte de sua obra publicada nas páginas de nosso combativo jornal.

O Almeidinha sempre se mostrou intransigente.

“Jornal é lugar de notícia. O estuário natural da Literatura, da poesia é o livro – e ponto e basta”.

De tanto insistirmos – mais para atazanar o Almeidinha do que por apreço aos versos do Poeta que nunca lemos, diga-se – o chefe topou dar uma chance.

“Traga-me dois sonetos. Publicaremos o melhor” – disse ele ao Poeta.

IV.

Foi o que o amigo fez. No dia combinado, lá estava ele com dois envelopes na mão. Entregou o primeiro deles em mãos.

Bastaram alguns segundos para o Almeidinha dar o veredito:

“Publicaremos o outro”.

– Como assim?, espantou-se o autor.

“Pior do que este, impossível”.

Entregou o outro envelope para o diagramador, e acrescentou:

“Na seção dos leitores, tá!”

V.

O Poeta ficou fulo da vida. Pegou os dois envelopes e se foi carcando o salto carrapeta no assoalho.

Ficamos um tempão sem vê-lo. Quando reapareceu no boteco, não tocamos no assunto. Afinal, o cara era nosso amigo…

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