Vou dizer o que vou dizer de tanto que me perguntam:
“Cara, não vai escrever nada sobre as vaias que Roger Waters recebeu nos shows que faz pelas cidades brasileiras?”
ou
“Cara, não vai escrever nada sobre a defesa que Roger Waters fez dos valores democráticos (e contra o candidato do PSL) nos shows que faz pelas cidades brasileiras?”
Não iria.
Mas, do tanto que apinhocaram meu celular de mensagens e Whats, filminhos e comentários – uns, aplaudindo; outros, na bronca – que aqui estou, meio sem ter grandes novidades a dizer, mas dizendo…
II.
Pelo que vejo aqui, no visor, e leio na Imprensa, não foi pouca coisa não o barulho que houve por lá.
Reflete o tal apartheid que lhes falei em post anterior, o divisionismo latente, o caldeirão a ponto de explodir que hoje vivemos (ou sobrevivemos) no Brasil.
Mostra também a esquizofrenia desses tempos bicudos – e põe bicudo nisso.
Juca Kfouri postou uma frase lapidar em seu blog, no Uol:
“(Pode-se) Eleger um fascista de verdade, achando que é de mentira, por causa de um comunismo de mentira que acham que é de verdade”.
III.
Quem foi à linda arena multiuso do meu Palestra, no fim de semana em São Paulo, para ver o espetáculo solo do ex-integrante do Pink Floyd e não sabia do posicionamento político do veterano Waters, por tudo o que ele e sua família viveram, que me perdoe a inconveniente observação:
Em qual Planeta você habita, cara pálida?
IV.
Desde sempre, o músico é um ativista pelos valores democráticos e cidadãos.
O avô de Waters morreu na primeira Guerra Mundial.
O pai, assassinado pelos nazistas, na Segunda.
Ele é um legítimo representante da geração dos anos 70. Aquela do lema “Faça amor, não faça a guerra”.
Ele faz duras críticas ao presidente Trump e outros trogloditas.
Luta pelas causas dos refugiados, pela diversidade.
Combate o avanço neo-fascista e a violência onde quer vá.
Óbvio, portanto, que no Brasil, neste preciso instante, Roger Waters iria se posicionar, com firmeza e clarividência.
V.
Quando a imagem #ELENÃO apareceu no telão a plateia, em Sampa, irrompeu em vaias dilacerantes e valentes aplausos. As primeiras bem mais efetivas que os segundos, é o que me dizem.
E o nosso venerando baixista inglês foi achincalhado de tudo quanto foi nome e encaminhamentos.
Criou-se um incerto e lamentável tumulto.
Mesmo assim, ele tentou se pronunciar.
O homem se disse um defensor dos direitos humanos.
(E a turma vaiando e aplaudindo.)
Antes de engatar outro dos tantos hits da banda, ressaltou que não gostaria de viver sob o governo de alguém que acha que “a Ditadura Militar foi algo bom”.
Foi só – e o suficiente!
VI.
Como disse, não assisti ao show.
Baseio-me nos relatos que recebi.
Não que não ame e ouça, ainda que esporadicamente, os grandes e emblemáticos nomes que compuseram a trilha sonora de minha juventude.
É sempre uma viagem este resgatar de sons e lembranças.
Só que tenho por norma não vê-los em ação, no palco, quando por aqui aportam.
É um jeito meu, entendam!
Um cuidado, diria.
VII.
Temo que, num desses shows, em meio a plateia, eu reencontre o garoto cabeludo, sonhador e algo inconsequente que um dia eu fui – e boca frouxa que era, o jovem pergunte ao titubeante senhor de ralos cabelos grisalhos:
– Como assim, coroa, o que está acontecendo com o País, com o mundo, com você, com as nossas utopias?
VIII.
Não saberia o que lhe responder. Como me justificar.
Talvez chorasse um pranto seco, sem lágrimas, covarde. Desesperançado.
O que você acha?