Gosto da ideia embora não me pertença, na origem.
Há sempre um autor em busca de uma personagem definitiva – aquela que lhe garanta a obra prima. Na arte e na vida.
Faz algum tempo que imagino escrever sobre o tema.
Não tratarei aqui de nomes, nem ouso descrever e esmiuçar os detalhes para dividir (hoje se diz compartilhar, não é isso?) com os prezados leitores a possibilidade da busca.
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Não são poucos os autores de quem ouvi e me garantiram:
– Há um bom naco autobiográfico em cada uma das linhas que escrevo.
Se não é exata e precisamente sobre aquilo que viveram, muito do que contam nasce de observações feitas ao redor. Ou de alguma causa que lhes impressiona sobremaneira. Leituras essas que, invariavelmente, passam pelo filtro da própria interpretação.
É da natureza humana olhar, ver, interpretar, vivenciar e, sobretudo, eis a proposta dos tempos atuais, ser também um narrador das coisas do cotidiano.
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Acho bem possível?
As cambiantes redes sociais estão aí. Repletas de relatos das mais variadas formas. Tensas e intensas, quase sempre.
Por que você também, caro leitor, não pode ser um autor em busca da personagem definitiva?
Vou lhe contar outra que, la’trás, já me contaram.
Em algum momento, mesmo que não tenhamos consciência de imediato, é inevitável que o predestinado encontro aconteça.
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Será que o meu prezado leitor soube preservar aí, ao seu lado, a tal personagem?
Parabéns, meu caro. Não deixou que a oportunidade rara se lhe escapasse.
Ou o amigo é daqueles que se incluem no verso daquela antiga e derramada canção de Tom e Vinicius:
Eu sei que vou sofrer a eterna desventura de viver
A espera de viver ao lado teu
Por toda a minha vida.
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Por favor, amiga leitora, sinta-se incluída na conversa. À vontade e a seu modo, pode e deve derramar-se à vontade.
Só não sei se o verbo ‘derramar’ define apropriadamente o caso. Aliás, caso, é outra palavra dúbia para detalhar o enredo. Que, se não é propriamente de novela, pode vir a ser. Tem lá um bom roteiro, suspense e mistério.
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O que sei, sem plena compreensão, é que, um dia, a/o figura surge diante de você que, incauto, sequer se dá conta da dimensão do encontro.
Mas, a partir daí, as coisas nunca mais serão as mesmas.
A vida não é mais a mesma.
Não importa se, naquele instante mágico, em meio ao ato social, ao lugar inadequado, à situação corriqueira em que se conheceram, vocês conversaram sobre banalidades ou tergiversaram sobre nobres assuntos. Não importa se foram interrompidos ou se outras pessoas se intrometeram e até mostraram-se mais importantes a um e a outro.
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Não importa.
Permanece a lembrança, o jeito de olhar, de sorrir, de envolver e se deixar envolver.
Permanece também o desejo de revê-la/o. Por tudo o que não houve. Por nada que lhe pareceu inesquecível.
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Eu, você, a própria pessoa que fez sua alma reluzir; ninguém entende bem o que seja.
Mas, sabe que é…
E só aí, mesmo que não verbalize, só aí é que tomamos consciência de que não há nada que resplandeça melhor a vida do que o ofício de amar e ser amado.
“O verdadeiro amor é vão.” – ensina Gil na esplendorosa “Drão”.
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Lembre, relembre, saboreie, deguste…
Não lamente se não viveu tudo o que poderia ter vivido.
Comemore tudo que pôde viver – e viveu, em determinado instante, que se fez eterno.
Escreva sobre o tema. A personagem definitiva.
Seja o narrador da própria história.
Parece um bom jeito de terminar o ano…
O que você acha?