Há quem discorde.
Mas, neste 28 de agosto de 1979, nós, os reformistas supostamente equilibrados e sensatos, aplaudimos a homologação da Lei da Anistia, ampla, geral e irrestrita, que passa a vigorar desde então no Brasil.
Temos um argumento sólido, os banidos, exilados políticos e congêneres, pouco a pouco, começam a retornar ao país e bem que precisamos dessas inteligências, desses saberes, dos valentes cidadãos que, mesmo em tempos obscuros, ousaram peitar o arbítrio e o autoritarismo.
Afinal, após o sacrifício de Vlado e Manoel Fiel Filho nos porões do DOI/CODI, ganham contornos mais nítidos as etapas para o fim da ditadura e a definitiva (?) consolidação de um regime de governo democrático, socialmente mais justo e contemporâneo.
Em 1977, estabeleceu-se oficialmente o fim da censura aos meios de comunicação.
Agora, a Anistia…
Enfim – e por fim, caminhamos.
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Mas, a moeda tem dois lados.
Por isso, mudo o tempo verbal – e chegamos aos dias atuais.
O lado obscuro, digamos assim, do tal processo “de transição pacífica e negociada” deu ensejo ao que ainda hoje o País não siga as determinações internacionais que propõem severas punições aos agentes do Estado denunciados por sequestros, prisões, torturas e assassinato no período em que predominem o autorismo e o regime de exceção.
Desde então – em períodos de sacolejo institucional – se discute se a Justiça prevaleceu.
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A priori, deu-se um passo importante – por muitos, inimaginável àquela época – para a almejada volta dos civis ao Poder.
Preservou-se a paz – e a ordem.
Talvez tenhamos comemorado precipitadamente o feito.
Ansiávamos o raiar de um novo tempo. De liberdade de expressão, equilíbrio social e cidadania.
Mas, a que preço?
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Hoje, há quem veja aí, neste vacilo, a base para o desastroso período de incivilidades e idiotias que enfrentamos.
Eclodiu o tal retrocesso que, supúnhamos, não mais viveríamos quando um opaco deputado federal reverenciou a memória do torturador mor – e muitos se calaram, outros aplaudiram entusiasticamente – em pleno Congresso Nacional.
Sou cético por natureza.
Pra mim, bastou.
Desde então desacreditei.
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Talvez por isso, 40 anos depois, tenho lá muitas dúvidas sobre a tal Lei da Anistia.
Penso que pode ser um dos fatores – e acredito que seja mesmo – para a deterioração do tecido social, mas não o único.
A propósito sugiro a leitura de um excelente artigo do professor português João Eduardo Coutinho, ontem, na Folha de S.Paulo.
Chama-se ‘Uma Conspiração de Estúpidos’. AQUI
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De qualquer forma, faço o registro da data, pois considero importante que se pense no assunto.
Há nove anos o Supremo Tribunal Federal, como dizem hoje, ‘passou o pano’ e ratificou a ‘inocência’ de agentes públicos envolvidos em crimes e hostilidades.
Nessa decisão, aproximadamente 40 ações penais sequer foram a julgamento.
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Nem tudo está perdido, porém.
Desde 2014, regurgita no Supremo, à espera de julgamento, o pedido para que seja cumprida a sentença da Corte Interamericana de Direitos Humanos, ligada à Organização das Nações Unidas, que condenou o Brasil, em 24 de novembro de 2010, a adotar uma série de medidas – entre as quais, julgar os carrascos que serviram a ditadura.
Não está perdido. Mas, um tanto enevoado, eu diria.
Depois de tantos anos, temo que os estragos maiores já tenham sido feitos.
Mesmo assim, hasteia-se a lona, pois o show tem que continuar…
O que você acha?