UMA NOVELA BLOGUEIRA – (foto: Leila Kiyomura)
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Sol da montanha
Sol esquivo da montanha
Felicidade, teu nome é…
Eita.
Poesia numa hora dessas!
Lembro o verso antigo assim que salto do jipão Land Rover que estaciona, sem cerimônia, junto a outros tantos, no terreno amplo, gramado, logo após a porteira da tal fazenda colonial que viemos, em bando, conhecer.
Olho o casarão distante (uns 300 metros), a trilha de terra, a silhueta dos morros nos arredores – e sei lá o porquê sinto-me em casa.
Talvez seja esta placa à beira do caminho a nos saudar:
Pousada Estrela dos Boêmios
Bem-vindos…
Inevitável sorrir.
De estrelas, estrelas, nada entendo.
Mas, o que tenho de amigos boêmios!
Lotariam todos os jipes do estacionamento (oito ou nove) e sobraria gente.
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Outros visitantes também reparam na placa e estranham.
Veem um paradoxo aí. Campo, natureza, vida saudável, estrela e boemia…
Perguntam-se:
Qual o sentido?
Dou de barato. Amei o tal nome.
Há tempos percebi que a vida não é lá uma estrada linear. Objetiva, coesa, direta e reta.
Vale pelas nuances.
O que se vê, o que se vive, o que se imagina e sonha.
Há coisas que a gente não sabe bem o que fazer com elas.
Nem tudo obrigatoriamente precisa fazer sentido.
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Diverte-me agora as explicações da nossa guia, uma senhora despachada, a Sueli, a explicar o inexplicável aos meus companheiros de passeio. Ecoturistas de fino trato e mochilas coloridas que arrepiaram ao ler o bendito slogan da pousada.
Estrela dos Boemios
Taí…
Achei lindo.
Inspirador.
Digo mais:
Coisa de artista!
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Assim que chegamos à enorme tenda coberta por uma lona branca, que serve de recepção aos visitantes, logo aparecem os funcionários da casa, gente simpática a nos oferecer café (aceito!), refrigerante de limão rosa (depois eu experimento!), pedaços de bolo (pego dois) e panfletos com as opções de passeios para o dia ‘inesquecível’ que ali passaremos antes de retornar à pequena São José do Barreiro, ao pé da Serra da Bocaina.
Ô lugar bonito, sô!
Ainda com um dos pedaços de bolo na mão, tento sair da muvuca. Caminho até o que me parece ser um improvisado mirante há alguns poucos metros dali. Subo os vinte lances da escada em caracol – e deixo que toda aquela paisagem me envolva.
Sinto o sol morno da manhã…
Lembro as aulas de Literatura no cursinho pré-vestibular.
A professora – hum, esqueci o nome da professora. A cena, entretanto, ainda preservo viva em minha mente: a moça hippie, descolada, rosto harmonioso, cabelos escorridos, cigarro entre os dedos, a recitar os versos de Oswald de Andrade:
Sol da montanha
Sol esquivo da montanha
Felicidade, teu nome é…
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Lembrei, amigos. Lembrei.
Teu nome é Isadora, professora!
Isso mesmo.
Nós a chamávamos de Professora Isa.
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Leila Kiyomura
7, abril, 2020Uma viagem ao pé da Serra da Bocaina sentindo o cheiro bom de mato, ver a cor do sol entre as montanhas
e descontrair na
Pousada Estrela dos Boêmios… Tudo que os leitores confinados precisam neste momento é o ar da novela blogueira. Sonho, poesia, natureza.
Agradeço a deixa da foto…