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O que o tempo leva… (4)

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UMA NOVELA BLOGUEIRA – (Foto: Arquivo Pessoal)

Arranjei uma pequena grande confusão.

Não sabem ao certo o que fazer comigo (Tipo aquela samambaia que cresceu além da conta – e agora atrapalha a passagem de todo mundo).

Chi se ne frega! – como diziam os italianos amigos do pai no Bar Astória, a beber cerveja e jogar Patrão e Sotto.

Sou de ascendência italiana, capiche?

Dos dois ramos da família.

Por parte de mãe, os Chisolini se orgulhavam em dizer que vieram de Mantova e de Florença.

Já o vô Carlito, embora nascido em Cascatinha no Rio de Janeiro, contava que os pais, os Avezzani, chegaram de Nápoles.

Por parte de pai, a coisa era mais simplória.

Martinos e Leones aqui aportaram no início do século 20, vindos da Calábria.

Era só o que diziam.

E só o que se sabe ainda hoje.

O norte e o sul da Velha Bota têm lá suas diferenças.

Digamos que os de cima se consideram mais ricos e cultos e belos enquanto os do sul são mais rústicos e turrões e belos.

Toda vez que o pai fazia das suas, não era raro a mãe justificar com o comentário nada lisonjeiro:

– Ah, calabrês, foi o diabo que te fez.

Como o pai aprontava muito e estava sempre em dívida com a mãe, ele apenas sorria e deixava  vida seguir naturalmente.

E assim a vida seguia.

Ô saudade!

Uma história que se ouvia na família (da mãe, lógico) ‘enaltecia’ a teimosia dos calabreses.

Era a seguinte:

Depois de andar pelo mundo, um homem, obviamente calabrês, quis voltar pra sua aldeia no sul da Itália. Andou, andou, até que encontrou o Senhor, disfarçado de eremita em uma clareira, que lhe disse:

– Bom homem, me diga aonde vai?

Ele respondeu:

– Ora, volto pra minha terra.

E o Senhor:

– Deveria dizer: ‘com a graça de Deus’.

– Volto pra minha terra, e pronto e basta – reiterou o calabrês.

O Senhor não perdoou:

– Então, por sua teimosia, será punido. Ficará preso por sete anos no charco da Solidão.

Naquele preciso momento, o caminhante virou um sapo e ficou a coaxar por sete anos no tal local determinado. A pular de lá pra cá e de cá pra lá.

Passado este período, desfez-se o encanto e o calabrês retomou sua caminhada.

Andou algumas léguas e outra vez o eremita/Senhor se interpôs aos seus passos, com a mesma indagação:

 – Bom homem, me diga aonde vai?

– Ora, volto pra minha terra.

– Deveria dizer: ‘com a graça de Deus’.

Desta vez, o calabrês sequer chegou a responder.

Entendeu com quem dialogava e, bem a seu modo, resmungando alguns  impropérios, retomou o rumo do Charco.

Essa historieta, como disse, ouvia na casa de meus avós maternos.

Há coisa de ano e tanto, passei uns dias recentes em Réggio Calábria, na ponta da Bota, e fiquei sabendo que o conto é do Norte da Itália e retrata o jeito de encarar a vida dos moradores de Biella, na região de Piemonte.

Houve também quem creditasse a façanha aos moradores de Trieste.

Os regiocalabreses  se empolgaram na discussão da origem da fábula  – e, sinceramente, saí da roda sem saber em quem acreditar.

Não importa muito. Não importa nada.

Também por aqui, neste Brasilzão de meu Deus transfigurado ou não de eremita, vejo muita gente tinhosa que só.

Mandando e desmandando.

Mas, isto é outra história que fica para uma próxima vez.

E nada do café chegar.

Bolo, então, pelo jeito, nem pensar.

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