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O que o tempo leva… (11)

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UMA NOVELA BLOGUEIRA – (Foto: Jô Rabelo)

Não preciso dizer, mas digo que…

…  a partir daquele instante, Carlos Artúlio, o Ator com A maiúsculo, passou a ser o centro das atenções da enternecida Pousada Estrela dos Boêmios.

Especialmente entre as mulheres, o grosso da caravana, assim que retornaram dos passeios, o entusiasmo se generalizou feito fogo no paiol.

Logo o reconhecem e passam a rodeá-lo.

Para onde quer que ele vá, nunca está sozinho.

Elazinhas se revezam em filas, até que comportadas, à espera da vez para as inevitáveis selfies.

Sorriem que sorriem.

Falam que falam.

Ficam aos cochichos, sussuros. Destacam esta ou aquela novela, esta ou aquela montagem teatral.

Um só paparicar

Carlos Artúlio interage numa boa. Sem qualquer estrelismo.

Está em casa – aliás, mora em um dos chalés.

Sem exagero, consolida-se como a grande atração do dia. Mais que montanhas, regatos, cachoeiras, o verde da natureza, as bromélias, o céu azul, essas naturalices (se me permitem o neologismo).

– O coroa é um charme – ouço uma jovem comentar ao passar por mim, passo firme em direção ao ator.

Por uns breves segundos, pensei que fosse comigo.

Sem noção.

Penso alto:

– Quem foi rei…

– Nunca perde a realeza – conclui o Felisberto, imbuído de seus pensares filosofais.

Desconfio que o certo é:

“Quem foi rei, nunca perde a majestade.”

Mas, não serei eu a questioná-lo.

Até estimo encontrar o Filósofo.

Aproveito para lhe agradecer o que fez por mim – e pergunto como foram as andanças morro acima com a turistada.

– O de sempre, gente boa – ele me responde.

E arrisca-se num complemento:

– Não atino bem o motivo que essas pessoas distintas, acostumadas ao conforto da bem-bom, vêm para esses perdidos onde eu e os meus nos escondemos. Olham pra nós e dizem: ‘Isto é que é vida!’. Ô minha Santa Catarina, estão de ironia. Ficam felizes, parecem animados. Passam umas horinhas, não largam a inseparável maquininha, e logo voltam para o lugar de onde vieram. Do jeito que vêm, eles se vão…

Nunca havia pensado nesse contra-senso.

– Falam que querem para espairecer, descansar, esquecer os dias corridos, as aflições da tranqueira de aldeia em que vivem. Que é barulhenta, com poluição, trânsito… Mas, voltam correndinho.

Concordo, faz sentido.

Mas, ele não terminou:

– Por aqui, Italiano, os dias são sempre iguais. Qual a novidade que buscam e não encontram? Faça chuva, faça sol. Todo o dia é dia de lida. Clareou, hora de roçar, tocar o boi, fazer o que tiver que ser feito. Entardeceu, é voltar pra casa, e seguir a sina. Assim é a natureza, assim somos nós.

O Filósofo está filosofando, como dizem por aqui.

Desabafa ou tenta me convencer de algo?

Sei não…

Ainda não entendi aonde pretende chegar, mas vai chegar.

Tenho certeza.

Agora me enche de perguntas:

(Perguntas que prefiro não responder.)

– Os caraíbas têm hora de trabalhar? Tem hora de espairecer? Hora pra rir?  Hora pra chorar? Hora pra amar? E, principalmente, hora pra desamar,  sei bem. Tem hora pra tudo, não?

Ele ri, debochado, diante da minha perplexidade.

Diz que é só um devaneio. Nada pessoal.

– O Italiano, você me parece diferentão dos outros. Pelo menos não lhe vi consultar uma só vez aquela engenhoca, o tal do celular. O pessoal vem pra cá e não desprega o olho e o nariz da engenhoca, rapaz. Dá uma ausência neles que é de assustar. Aí, vão ver a cachoeira, a montanha, o azulão do céu, a passarada e não olham no ampliado. Preferem ver pelo buraquinho da câmera e depois dizem que é pra ter uma lembrança do lugar. Lembrança do quê, moço? Se não viu do jeito que haveria de ver. Concorda?

Até concordo, só não vou dizer a ele que, por descuido, joguei meu celular na mochila sem ver que a bateria estava zerada. Também esqueci o carregador no hotel.

Tenho um nome (ou melhor, um apelido ) a zelar, não convém cair na vala comum do descrédito.

Melhor perguntar algo para ele não insistir na temática da telefonia celular.

– Sempre morou aqui, Felisberto?

(Nunca sei se o chamo de Felisberto ou me dou à familiaridade do apelido.)

– Nasci em Bananal, me criei em São José, dali para Guaratinguetá e, depois, por bons anos – uns 15 – morei na Capital, mas nem gosto de lembrar isso, não.

Fico em silêncio, não quero ser invasivo.

Mas, ele é falante:

– Aquilo não é pra mim, não. Nunca fui feliz por lá. Um desconcerto no coração – e resolvi voltar pro meu lugar.

Eita!

Agora que fiquei curioso.

Pergunto ou não pergunto – eis a questão.

1 Response
  • VERONICA PATRICIA ARAVENA CORTES
    5, maio, 2020

    Super concordo com o tio Carlos

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