Fotos: Reprodução
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Uma boa hora do meu dia: quando me aquieto para ler…
Carmen: Uma biografia –
A vida de Carmen Miranda, a brasileira mais famosa do século XX.
Autoria: Ruy Castro.
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Comprei o tijolaço (600 páginas aproximadamente) há alguns muitos anos.
Serviu de base à orientação que fiz a um grupo de formandos de jornalismo que desenvolveu um livrorreportagem sobre música popular brasileira como trabalho de conclusão de curso.
À época, fiz apenas algumas consultas do que propriamente uma leitura detalhada – pois, a biografia é dividida didaticamente ano a ano, período a período.
Confesso que olhei mais o contexto do que a personagem propriamente dita.
Só agora volto a folheá-lo mais atenta e prazerosamente.
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Ando pela casa da página 200 quando Carmen parte para a grande aventura nos Estados Unidos.
Assim como milhões de brasileiros naquele longínquo 1939, posso lhes dizer que também estou aqui, hoje, a lamentar a partida da nossa estrelíssima Rainha do Samba no vapor Uruguay para as tais andanças em terras de Tio Sam.
Não se espantem, caríssimos leitores.
A magnitude da figura de Carmen, magistralmente retratada pelo biógrafo, é um dos méritos do livro. Sem dúvida, o maior de tantos outros como o texto fluente, a riqueza de informações, a ambientação, a clareza e outras virtudes.
É maior inclusive que os dissabores daquele período em que se deu a Segunda Grande Guerra e as vicissitudes da ditadura Vargas no país.
Há descrições de momentos saborosos que nos transportam ao clima de encantamento que se espalhava pela cidade do Rio de Janeiro (capital e tambor do Brasil), especialmente a vida noturna com seus cassinos e tradicionais pontos de encontro.
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O embarque de Carmem (para uma temporada de um ano) gerou uma comoção nacional.
A cantora se dizia cheia de dúvidas.
Depois de ter conquistado o Brasil e a Argentina em menos de 10 anos de carreira, teria que partir do zero na nova empreitada.
Lá, entre os ianques, se apresentaria na Broadway, flertaria e conquistaria Holywood, mas naquele exato e decisivo instante sentia-se (e era) apenas uma ilustre desconhecida na nova praça.
Tinha certa fluência no espanhol, e nenhuma intimidade com a língua inglesa.
Talvez por isso buscou no amigo Paulo Machado de Carvalho, dono da Rádio Record em São Paulo, o aconselhamento. Se deveria ir ou não?
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A resposta:
“Acho que você deve ir, Carmen. A coisa parece incerta e pouco rendosa, mas há certas vantagens que você precisa levar em consideração. Um sucesso nos Estados Unidos, mesmo relativo, aumentará sua fama na América do Sul. Além disso, há programas de rádio, os nightclubs. E Holywood. Se com tudo isso você fracassar, pode voltar que eu lhe darei um emprego na Record até o fim de seus dias.”
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Curioso – e Ruy deixa claro isso ao longo da narrativa: o temor de Carmen não encontrava eco nos quatro cantos do país que a idolatrava.
Era bem outra a preocupação da grande multidão que foi vê-la embarcar, com seus baús repletos de roupas de baiana, balangandãs e turbantes.
A bem da verdade, os milhões de fãs intuíam, acertadamente, que tão cedo a estrelíssima não retornaria tamanho sucesso que alcançaria por lá.
Querem um exemplo precioso, garimpado pelo autor Ruy Castro?
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Leiam:
A revista Carioca, daquele mesmo mês de maio, publicou uma colaboração de um leitor de Belo Horizonte, Fernando Tavares Sabino, que profetizava:
[Nos Estados Unidos] Carmen Miranda arrebanhará milhares de fãs com sua voz expressiva de legítima sambista. É até capaz – e eu protesto desde já – de querer ficar por Holywood, pois mais contratos vantajosos não lhe faltarão. Mesmo porque, além de sua garganta de ouro, tem ela uma fachada bem jeitosinha e um corpinho de se tirar o chapéu.
O leitor, bem safadinho, – escreve Ruy – era o futuro cronista Fernando Sabino, ainda cheio de espinhas aos quinze anos e meio.
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Saudades do Brasil!
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O que você acha?