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Historiadores do cotidiano

Foto: Reprodução

Anos 70.

Éramos jovens, algo inconsequentes e sonhadores.

Recém-saídos do curso de jornalismo da Universidade de São Paulo, eu e o amigo Clóvis Naconecy planejamos escrever um enciclopédia sobre a efervescente MPB. Uma “obra” que açambarcaria desde a origem do nosso cancioneiro popular até os dias de então.

Haveria verbetes dedicados a cada um dos artistas – cantores e/ou compositores – dos mais variados gêneros e estilos.

Ainda ofereceríamos, em anexo, aos nossos prováveis leitores alentadas entrevistas com os nomes que, então, julgávamos luminares do nosso tempo.

Cheguei a entrevistar Elis Regina e Milton Nascimento para tal finalidade. Mais Elis do que Bituca, que é sempre monossilábico em suas falas, achou o projeto sensacional – mas, fez um reparo:

“Como farão para dar conta de tamanha tarefa. A cada dia surge um nome novo, uma nova tendência musical. Como vão mapear o país todo, todas as regiões. Já pensaram nisso?”

Não. não havíamos sequer cogitado.

Como disse acima, éramos jovens, inconsequentes e pra lá de sonhadores.

Talvez por isso sequer imaginávamos o tamanho da encrenca.

Não preciso dizer, mas digo, que tal enciclopédia nunca saiu dos nossos arrebatados delírios.

Abortamos a empreitada por conta dos nossos afazeres diários. Até porque, numa primeira listagem, batemos em quase 200 nomes e outras tantas indefinições:

Grupos vocais entram?

E as orquestras?

Letristas como Mário Lago e Orestes Barbosa merecem um verbete?

Músicos?

Por aí andávamos quando, silenciosamente, e sem uma tomada decisão oficial para nós mesmos, abrimos mão de tão magnânimo projeto.

Coisas da vida.

Lembro a breve historieta porque ontem, por conta do Dia do Jornalista (obrigado a todos aqueles que lembraram-se deste  humilde escrevinhador), derrapei na curva ao relacionar alguns nomes fundamentais ao jornalismo que hoje se pratica. Nomes que estão na ativa – e sobre os quais não pairam quaisquer dúvidas.

O que escrevem/publicam/falam/transmitem, eu assino e dou fé.

Quis modestamente homenageá-los.

Mas, como sempre, em ocasiões como esta, incorre-se em esquecimentos, por vezes, indesculpáveis.

Pois é…

Assim que terminei de blogar, instantes depois ao desligar o notebook, começou a pipocar na minha insensível cachola nomes e mais nomes que, com todo o mérito e justiça, poderiam (e deveriam) constar da lista.

Olha a dúvida a me corroer:

“Volto lá e atualizo a relação? Ou deixo para amanhã – e tenho assim um tema para um novo post?

Ao cabo de hora e tanto, pincei e anotei dez, doze nomes de próceres do jornalismo.

Alguns amigos e leitores também me cobraram, via Whats, a inclusão de outra penca de louváveis menções.

O que fazer?

Desisti de atualizar o texto de ontem.

Diria que o meu vacilo já era público e estava constatado e consagrado.

Ok. Vamos a um novo post – e uma nova relação que, por sua vez…

Peraí!

Chega o e-mail do amigo Escova lá dos confins da França onde vive desde 2016 ou 17.

Ele me faz um telepático alerta:

“Nem tente completar a relação de ontem com uma nova relação. Logo terá que postar uma terceira para completar a primeira e a segunda – e, no dia seguinte, uma quarta, depois uma quinta e assim sucessivamente…”

Escova, o sábio,  se autointitula ombudsman do nosso humilde Blog.

É um amigo de longa data, outro dos grandes jornalistas com quem tive a honra de trabalhar e conviver na velha redação de piso assoalhado e grandes janelas para a rua Bom Pastor.

Detesto ter que reconhecer: o cara tem razão.

Melhor deixar como está para não me complicar ainda mais.

Louvados sejam, pois, os bons jornalistas, aqueles que se fazem, com rigor e dignidade, os verdadeiros historiadores do cotidiano.

Não me furto, no entanto, em lhe encaminhar, também por e-mail, uma provocação:

“Será que tem tanta gente assim fazendo bom jornalismo. Vejo raros e parcos na TV, na Internet?”

Escova responde investido do tom professoral que tão bem lhe cabe e que ganhou em anos de reportagens nos becos e bocas das quebradas do mundaréu:

“Que tem, tem, incrédulo amigo! São todos aqueles que propagam o legítimo direito do homem à informação. Acredite, rapaz! Pois, se os não houvesse, eu lhe diria, também não haveria mais qualquer esperança”.

 

 

 

 

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