Ilustração: Reprodução
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Jeremias, o amável, seguiu os conselhos do bom doutor que cuida da sua saúde.
Matriculou-se numa academia para por fim ao sedentarismo que, disse o bom doutor, lhe encurta a vida.
Jeremias não fuma.
Bebe apenas socialmente, mas passa longe de qualquer esforço físico.
Vai daí que…
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Lá está o homem no primeiro dia de exercícios.
Ele caminha ao lado do instrutor e ouve atentamente as orientações:
“Começaremos com uma leve caminhada de 3 quilômetros, ok?”
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Jeremias, o amável, respira fundo para enfrentar o primeiro desafio.
Posiciona-se na esteira, escolhe a velocidade que lhe é adequada (“para iniciantes preguiçosos”, alerta ele ao personal que lhe atende) – e vai daí que…
“Não é tão ruim” – diz a si próprio e ao zipper do colorido agasalho que comprou para tal finalidade.
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Poucos minutos depois, um portentoso companheiro, desses de músculos bem-fornados e altivo, posiciona-se no equipamento ao lado.
O moço desata a correr feito um campeão da São Silvestre.
É um tanto constrangedor para o esquálido Jeremias o tamanho do contraste.
Mas, pensa consigo, todos os sacrificios valem para cumprir os conselhos do bom doutor.
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Por um desses casos do acaso, não dura muito a tresloucada maratona do atleta ao lado.
O distinto reduz a velocidade da máquina e a sua própria ao ver o instrutor se aproximar.
Os dois começam a conversar aquela conversa de pato pra ganso que tanto aborrece Jeremias seja qual for as circunstâncias.
Vai daí que…
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Impossível não ouvir o que dizem.
O assunto é variado.
Passa por diversos temas. De política a futebol, de baladas ao terrível trânsito da cidade.
Jeremias lamenta não ter acrescentado um fone de ouvido ao uniforme acadêmico.
Não esquecerá da próxima vez.
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Se houver próxima vez, se bem conheço Jerê…
O moço agora diz que é “um colecionador de armas”, “assíduo frequentador de clubes de tiro”.
O personal esboça um enigmático sorriso – cumplicidade, indiferença ou espanto?
(Nunca vamos saber.)
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O rapagão continua entusiasmado com o papo.
Diz que o top da sua coleção é uma escopeta com lente poderosa – e alcance do tiro de 800 metros.
“Do prédio onde moro, acerto qualquer alvo nessa distância. Tenha o tamanho que tiver.”
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Vai daí que…
Jeremias que a tudo ouvia, em silêncio, resolve intervir.
Salta da esteira ainda em movimento – e respeitosamente pergunta ao cidadão onde ele mora.
“Só por curiosidade.”
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O fortão estranha, mas responde por alto à pergunta.
Moram em bairros distantes um e outro,
Jeremias fica aliviado.
Faz o sinal da cruz e despede-se de ambos (o suposto atirador e o personal).
“Por hoje, deu!” – avisa.
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E vai embora com seus pássos lépidos.
Antes, porém, passa na secretaria e cancela a recente matrícula.
” O lugar me é um tanto inóspito.”
No mais, diz que prefere caminhar ao ar livre, no Parque, sem esquecer os fones de ouvidos, no embalo das antigas canções do Roberto.
Vai daí que…
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Ouçamos aquela canção do Roberto:
O que você acha?