Foto Arquivo Pessoal
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Faz alguns anos que o Veríssimo (ou o Cony) fez o seguinte relato, numa de suas crônicas:
Conta-se que no velório do presidente americano John Kennedy, uma senhora foi se achegando junto ao caixão – e, quando percebeu, estava ao lado da viúva. Não se conteve diante do inusitado da situação. Achou, então, oportuno consolá-la de alguma forma. Fez um gesto com o rosto a indicar o presidente assassinado e tascou a pergunta:
– Então, Mrs. Kennedy, fora isso, o que a senhora achou de Dallas?
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Lembro a historieta – e me sinto assim como a intrusa no velorio – toda vez que ouço e leio o noticiário sobre as contundentes ameaças à democracia que vivemos desde que o Estropício, seus generais de estimação e asseclas chegaram o poder (pelo voto direto, diga-se) no Brasil em 2018.
– E aí? – me pergunto e pergunto ao Escova por zap. – Quando esses caras vão ser presos?
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Escova divertiu-se com a lembrança da crônica e da minha, digamos, ingenuidade.
Para o amigo, o golpismo está solidamente encravado em nosso dia a dia.
– Não vai ser tão simples assim, não.
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Ele me alerta.
A eclosão da direita e da ultradireita tomou forma ainda nas manifestações de 2013.
Envolveu (e envolve) outros tantos segmentos da sociedade: a turma da FIESP, grande parte do agronegócio, o pessoal da Faria Lima que aposta na espiral financeira, uma elite tacanha e egoísta, parcela do judiciário que embarcou na primeira hora na canoa-furada da Lava Jato, os grupos de comunicação também fizeram uma leitura equivocada do que estava acontecendo e, principalmente, um contingente enorme de desvalidos que se sentem humilhados e sem representatividade nos poderes constituídos.
Completa o Escova:
– Os militares não gostaram da reeleição de uma ex-guerrilheira. Sentiram-se ameaçados pelo espaço que ganhou a Comissão da Verdade”.
Foi a deixa para o assanhamento dos ânimos nos quartéis.
– Sorte nossa que houve resistência por parte dos militares que prezam a sensatez e a legalidade. Mas, nossa democracia ficou por um fio.
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Tenho uma tendência a não discordar dos amigos.
Reconheço que faz todo o sentido as coisas que o Escova diz com ares professorais.
Ele é um cético.
Tanto que foi morar na França (ao lado da filha e dos netos que já estavam lá) assim que chorou ao assistir pela TV aquela sessão do Congresso que decretou o impeachment da presidente Dilma Rousself.
– Isso aqui não tem mais jeito não – ele disse á época.
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Por essa e por outras, perguntei sobre o que ele acha da propalada anistia aos golpistas em discussão no Congresso e em pauta no noticiário de todos os dias.
Escova sabe que sou um sentimental.
Mudou de assunto.
Respondeu com outra pergunta, tal e qual a senhora do velório.
– Fora isso, o que você achou do Botafogo campeão da Libertadores?
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A TRILHA SONORA:
De João Bosco e Aldir Blanc…
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O que você acha?