O Maurício chegou logo cedo à Velha Redação de piso assoalhado e grandes janelões para a rua Bom Pastor. Estava acompanhado do vereador Almir Guimarães e trazia um convite irrecusável para aquela manhã de sábado.
– Querem comer a melhor feijoada do mundo?
Um olhou pro outro, o outro olhou pro um – e decidimos no palitinho quem ia e quem ficava de plantão para tocar o dia-a-dia do jornal. Tínhamos uma edição semanal que circulava às sextas. Salvo exceção, sábado não era um dia tão agitado assim.
O pessoal todo comparecia mais para ‘provocar’ programinhas como este que se apresentava.
Partimos em dois carros.
O Almir, o Maurício e o Escova em um. O Made, o Nasci e eu em outro.
Para lugar incerto e não sabido, como de costume.
Só o Maurício sabia o destino final.
II.
A primeira parada foi num boteco na própria Bom Pastor: Batidas do Martins. O Nasci achou que aquela de amendoim “estava um tanto enjoativa”. “A cerveja estava quente”, acrescentou o Made. “E zero de mulher”, finalizou o Escova.
Escova que, diga-se, estava vivendo um novo e secreto amor.
Acabara de conhecer a mulher da sua vida.
“A décima centésima primeira, só naquele ano”, fiz questão de ressaltar.
E o inverno não havia chegado, registre-se também.
III.
Duas ou três paradas para nos reabastecer, enfrentávamos a via Anchieta rumo ao desconhecido.
Alguém apostou que o Maurício estava nos levando para um restaurante no Litoral.
Consideramos a hipótese, mas queríamos mesmo descobrir quem era o novo caso do Escova, se era do jornal ou não, se era conhecida do pedaço, casada, solteira
ou vamos-que-vamos.
O Nasci chegou a cogitar – com algum fundamento – que estávamos com ‘uma saudável invejinha’.
O Maurício era o único que não dava pitaco na história. Apenas ria das nossas conversas, além de, em tempos em tempos, lembrar do objetivo daquela jornada.
— Vocês vão comer a melhor feijoada do mundo.
IV.
Já andávamos desconfiados do jeitão maroto com que o amigo repetia a frase em todas as paradas etílicas obrigatórias.
A coisa piorou quando o Maurício, dirigindo o carro da frente, saiu da Anchieta para o trevo que dá acesso à Estrada Velha de Santos (aquela mesmo que deu origem à música do Roberto).
Mas, o que será que se passava na cabeça do moço?
V.
Da estrada vicinal para embicarmos em um atalho de terra, foi coisa de meia hora, se tanto. Dali para outro, e depois outro e mais outro, também não levou uma hora redonda, tempo suficiente para nos imaginarmos (exceção do Maurício, claro) definitivamente longe do mundo e da civilização.
Etapa seguinte foi embicarmos em uma ponte estreita que mal cabiam nossos veículos – e finalmente desembarcamos nos arredores de Estação da Eletropaulo, em um modesto sítio, perdido nos arredores da represa Billings.
Um espetáculo o lugar.
VI.
Lá um simpático casal, de certa idade, já nos aguardava. Sorriso nos lábios, caldeirões fumegantes, bebidinhas e a melhor feijoada do mundo.
Dona Sandra fez as honras da casa, ao lado do maridão, o seo Antônio:
– Amigos do seo Maurício são nossos amigos também. Sejam bem-vindos, e tomara façam gosto e proveito.
VII.
Fartamo-nos a valer. Sem remorsos tolos, e na dimensão da alegria do organizador do evento.
Quem?
Ora, senhores, quem poderia ser? Maurício de Castro, ex-vice prefeito e vereador de São Bernardo, nosso grande amigo que faleceu nesta semana.
Saudades…