Nosso (Des)Governo entregou hoje a propalada proposta da Reforma da Previdência ao Congresso.
Os Donos do Poder (e os amigos dos Donos do Poder) sorriem de orelha a orelha.
Para o trabalhador, as merrecas de sempre – e a conversinha afiada de que só assim salvam o país da hecatombe que, uns pelos outros, como bem sabemos, eles próprios são os (ir)responsáveis.
…
Lembro uma crônica do Rubem Braga – Noite de chuva em Sevilha – em que nosso maior cronista narra a experiência que viveu em uma noite de chuva grossa e ininterrupta que o pegou na linda cidade da Andaluzia.
Ele estava em viagem para o Marrocos (onde era do corpo diplomático brasileiro), mas resolveu fazer um pernoite em plagas de Espanha. Olé…
…
O Velho Braga conta que procurou refúgio da tempestade numa boate chamada Bodega. Que lhe pareceu bastante convidativa e, vá lá, aconchegante para um brasileiro solitário, sedento e curioso das gentes do mundo.
Além do que, ficava próxima ao hotel em que se instalara.
…
Lá pelas tantas, entre as atrações da noite, surge um mágico alemão anunciado como “de renome internacional”. No palco, o tedesco fazia o que podia para prender a atenção dos espectadores. Que, a bem da verdade, estavam mais preocupados com as fortes pancadas de chuva do que propriamente com os truques que o tal apresentava.
O grande momento do show se deu quando o homem enfiou na boca uma dúzia de giletes e… Foi exatamente aí que uma senhora americana – já breaca – saiu de sua mesa, partiu pra cima do mágico e perguntou:
-Do you speak english?
…
O que aconteceu?
Não sei.
O cronista e seus lampejos criativos.
Braga termina o texto a ressaltar que não lhe foi possível contar o final dessa extraordinária história em Sevilha.
“Toda história tem vez de ser contada” – escreve ele. “E acho que esta perdeu a sua… Também chovia demais.”
…
Explico o que me fez lembrar a crônica.
Falo da sensação que tenho, ao ver tudo o que hoje acontece no Brasil. Que, um dia, imaginamos ser o País do Futuro.
Futuro que, diga-se, ameaçou se fazer presente por brevíssimos períodos em nossa História.
Toda vez que reluz a esperança do tal despertar do gigante adormecido, em berço esplêndido, vem a trombada, a decepção e o inevitável retrocesso.
…
Acho, desconfio que, ao menos para os acima de 50 (tenho um pouquinho muito mais que isso), a utopia de um país justo e solidário perdeu a hora e a vez de acontecer.
E, olhem, que nem sequer tem chovido tanto assim.
O que você acha?