Foi uma tríade de mulheres que fez o samba alcançar picos de popularidade nos anos 70.
Clara Nunes, na Odeon.
Alcione, na Phiilips/Polygran.
Beth Carvalho, na RCA Victor.
Antes delas, nesse renascimento do gênero, vieram os afros-sambas de Vinicius e Baden, a “Casa de Bamba” de Martinho da Vila, e Paulinho da Viola com a extraordinária “Foi Um Rio Que Passou em Minha Vida”.
Diria que esses abriram o caminho para que as três pudessem passar fortes, soberanas, inquestionáveis.
Clara, guerreira – e seu samba raiz, a saudar as origens baianas, vigorosa e engajada;
Alcione, a diva da noite paulistana – com a fluência do samba notadamente romântico, embalado pelo jeito único, algo arrastado e inspiradíssimo de cantar;
E Beth Carvalho, a madrinha. Rio de Janeiro na veia. Explosão de alegria. O samba que arrasta, o samba que empolga, o samba que samba.
Se Clara e Alcione chegaram com uma plêiade de autores mais convencionais, que vinham da chamada MPB então em alta, Beth veio plena de novidades.
Dos subúrbios e morros cariocas, abriu alas para Zeca Pagodinho, Arlindo Cruz, Sombrinha, Almir Guineto, o grupo Fundo de Quintal, entre outros.
Na outra ponta da história, foi Beth quem resgatou marcos de nossa cultura popular até então esquecidos – pra não dizer abandonados – como Cartola, Nélson Cavaquinho, Clementina, Dona Ivone Lara, entre outros.
…
Lembro o velho casarão da gravadora RCA, ali, no bairro de Santa Cecília, e Beth a falar desses novos tempos do samba para um grupo de repórteres desconfiados – eu, entre eles.
Era o lançamento do novo disco “De Pé No Chão”.
Ela estava empolgada. Falava dos novos autores e da velha guarda do samba rediviva. Falava de um novo Brasil, inclusive no âmbito político. Corajosamente, prognosticava tempos de redemocratização. O fim da censura e a anistia (que se deu no ano seguinte, em 79) seriam os primeiros e decisivos passos.
Nós, repórteres, nos entreolhávamos receosos de acreditar em tamanhas e auspiciosas certezas.
– Essa garota está iluminada, alguém falou.
…
Voltei a entrevistar Beth outras tantas vezes. Nos anos 80, especialmente. Já como uma cantora consagrada. Abençoada e abençoando tantos e tamanhos.
Mas, aquele primeiro encontro me é inesquecível.
Foi pleno de luz e sonhos.
…
Se este primeiro de maio já se preconizava como um dia triste pelos 25 anos da morte de Ayrton Senna e também pela implosão dos direitos trabalhistas em nosso país, a morte de Beth Carvalho só acentua nosso estado de luto… E de luta, como a Madrinha tanto nos ensinou.
Beth completaria 73 anos no domingo.
O que você acha?