X.
Para efeito de registro histórico, vale registrar que a primeira a usar acanhaque que vi na vida foi o cantor Luiz Vieira, autor de “Menino Passarinho”, entre outros sucessos do nosso cancioneiro, isso lá em fins dos anos 50.
Continuemos, pois.
Acabei por me habituar a ver meu rosto ornado por um cavanhaque aparado em máquino um e frisado cuidadosa e artisticamente pela navalha do amigo Abílio.
Assim fiquei por anos e anos a fios.
Mudei de emprego, cheguei aos cinquenta e deixei de frequentar assiduamente o bairro do Ipiranga.
Em outras palavras, diquei distante do auxílio do luxuoso do Abílio para manter, nos rigores da estética, minha barbicha aprumada.
O resultado não poderia ser pior.
Caí na vida.
Quer dizer, passei de mão em mão de profissionais vários, uns mais, outros menos competentes. E digamos: perigosos.
XI.
Vocês riem, incautos leitores que ainda persistem em aqui me acompanhar, porque não imaginam a aventura que é ficar ali deitado, sob um avental de origem suspeita, com um cidadão desconhecido ao seu lado com uma lâmina na mão.
Pequenos talhos no rosto foram vários.
A cada semana, o cavanhaque ganhava formas – por vezes tortuosas – e densidade a bel prazer do autor da façanha.
E não adiantava falar, pedir, implorar para que era só uma aparadinha – e pronto.
Nos salões mais modernos, habituados aos tais metrossexuais, era comum ser “assediado” para fazer uma depilação geral – tirar os pelos do nariz, dos ouvidos, acertar as sobrancelhas…
Eu, hein!
Encerrava o papo numa só tacada:
– Só quero acertar o cavanhaque, pode ser?
XII.
Certa ocasião, manhã de sábado, lembro bem, o Vieira, um dos profissionais da tesoura mais confiáveis, simplesmente atropelou com máquina zero o meu cavanhaque. Eu e ele ficamos arrasados com “o acidente de trabalho”. Depois, ele não quis cobrar – mas eu paguei – e me confessou.
Estava devastado.
A doce Nanda, sua mulher, o abandonara.
Tudo bem.
Vida que segue.
O drama dele era bem maior que o meu.
Semana seguinte, eu já exibia uma barbinha à moda do Jeca Tatu.
Mas, a “namorilda” dele estava com jeito de que se escafedera de vez.
*amanhã continua…