(A VITÓRIA DE TANCREDO NO COLÉGIO ELEITORAL)
Esses quase 21 anos de autoritarismo causaram danos consideráveis em todos nós. Houve quem viveu mais de perto os desmandos do arbítrio e da prepotência. Houve também quem sofreu na própria pele a violência da ditadura, muitas vezes impiedosa para com os adversários. Foram tempos negros, onde se alastraram, como devastadora praga, o vazio cultural e político, a tecnocracia oportunista, a corrupção, a impunidade e a debaclê econômica e social.
A vitória de Tancredo Neves consuma o fim do mais longo período de exceção de nossa história. As esperanças renascem a partir da nova realidade, que raiou terça-feira em Brasília. E, das próprias cinzas, ressurge o ideal de um novo Brasil. Um Brasil, enfim, para todos os brasileiros.
São dois momentos distintos. Das trevas à luz, tenha a certeza, caro leitor, não se chegou pela complacência dos que se arvoraram donos do Poder. Ao contrário. Foi com muita luta que se conseguiu mudar a trajetória obscurantista em que mergulhou o País.
Com a maturidade de quem sabe o que quer, a Nação retomou lentamente os direitos inalienáveis que lhe foram usurpados à revelia. Entendeu logo que a luta armada não era solução. Evitou o conflito. Mas, não esmoreceu. Preferiu organizar-se pacificamente. Obteve junto ao governo Geisel o incentivo à distensão política. E, por essa brecha, para muitos imperceptível, deu início à série de conquistas, lentas e graduais. Irreversíveis, porém. E vieram a abertura, a anistia, a revogação dos atos de força, eleições para governadores até desaguar na extraordinária mobilização nacional pelas Diretas-já, aspiração maior de mais de 90 por cento dos brasileiros.
Com efeito, as manifestações, que se alastraram pelos quatro cantos do País, reunindo milhões e milhões de pessoas, foram de tal forma impressionantes e decisivas que puseram a pique toda e qualquer pretensão do continuísmo do Sistema e seu indefectível candidato, o senhor Paulo Maluf.
É certo que não conseguimos as diretas para presidente. No entanto, as mudanças – ficou bem evidente – eram irrefutáveis. E pra já!
Tivemos, então, um momento de rara grandeza entre os políticos nativos. O alto comando do PMDB e os líderes da dissidência do PDS abriram mão das divergências partidárias e dos projetos pessoais. E, num gesto de extrema habilidade, consolidaram a vitoriosa candidatura de Tancredo Neves a presidente da República.
Presente nos momentos de maior relevância da política nacional dos últimos 50 anos, o mineiro de São João Del Rey, Tancredo de Almeida Neves, reúne virtudes indispensáveis para conduzir o País tranquilamente nesse período de transição. Conciliador, por natureza, não se vergará ante a responsabilidade de viabilizar o sonho de todos nós: restabelecer a democracia plena e soberana, consolidar nossas Instituições em instrumentos duradouros e reguladores da vida nacional. E, principalmente, fazer da justiça social um bem que atinja, indiscriminadamente, a todos os brasileiros.
Ao trabalho, presidente Tancredo. Que a Nação, consciente de sua força participativa, não lhe faltará!!!
*18 DE JANEIRO DE 1.985 na coluna ‘Caro Leitor’. Texto que escrevi como diretor de Redação de Gazeta do Ipiranga, publicado também no livro “Às Margens Plácidas do Ipiranga”, em 1997. Era um sonhador…