Aconteceu de precisar comprar algumas quinquilharias aqui para casa e lembrei-me de uma sortida loja de armarinhos que existe no Planalto, bairro onde morei por muitos anos [meus pais também moraram] em São Bernardo.
Sou um homem velho, movido a lembranças como bem sabem meus cinco ou seis leitores [se é que ainda andam por aí].
Achei boa a escolha, confortável.
E lá fui eu rumo à Avenida Álvaro Guimarães, coisa de cinco, dez minutos, distante aqui de casa [óbvio que depende do trânsito do trevo do quilômetro 18 da via Anchieta, sempre imprevisível].
II.
Assim que cheguei, vislumbrei uma vaga na calçada bem em frente ao estabelecimento.
Ô sorte…
Pensa que pensa, resolvi entrar de traseira pois facilitaria a saída na hora de ir embora. O trânsito na Avenida é intenso.
III.
No que adiantei o carro alguns metros para dar a ré, eis que surge uma senhorinha a bordo de seu “cometa platinado” e ocupa rapidamente a vaga que intuí fosse minha.
Ela percebeu que eu estava ali e manobrava cuidadosamente para estacionar? Notou que aquela era a última vaga-vaga? Quis ser mais esperta visto que esta é a regra do jogo atualmente?
Diria que sim para as alternativas apresentadas…
IV.
Mesmo assim, resolvi deixar pra lá.
Tem coisas que não valem a discussão.
Toquei em frente.
Desisti das compras, do armarinho e da leve nostalgia que me invade quando ando por ali. Parece que vou encontrar algum conhecido e, assim, num toque de mágica, os bons tempos estarão de volta. Tempos da cordialidade, dos vizinhos fraternos. Tempos de esperanças, de encontros fortuitos e a certeza de que, como diz Pessoa, “tudo vale à pena, se a alma não é pequena”.
V.
Enquanto seguia pela Avenida de asfalto novo e novos canteiros centrais, ruminava certo desconforto, confesso.
A alma do mundo se apequenou?
Aquela idiotazinha de leg e cabelos tingidos merecia um bom esparramo.
Deixa pra lá…
VI.
Lembrei um velho editorial que o jornalista Mino Carta escreveu, nos idos dos anos 70, para o seu impávido e breve Jornal da República.
Ele viu duas portentosas damas da nossa sociedade se esfalfar em impropérios na vã tentativa de chegar em primeiro junto à bomba de gasolina para encher o tanque de seus possantes [Os aumentos dos combustíveis eram anunciados pelo Governo Militar minutos antes de os postos gasolinas encerrarem suas atividades. Formavam-se longas filas]. Tudo para economizar alguns trocados.
Mino previu que, se esse comportamento egoísta se perpetrasse no que chamou de elite [ou classe média, não lembro bem], não haveria futuro para a democracia que ainda almejávamos conquistar. E que ainda, tantos e tantos anos depois, bambeia em cacos e desmandos.
VII.
Por hoje já escrevi demais.
Mas, nem tudo está perdido, amigos.
Amanhã ou segunda, eu conto a parte boa dessa rápida visita ao bairro do Planalto.
Aguardem a linha de passe…
*(foto: arquivo pessoal)
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O que você acha?