Aos formandos do curso de Jornalismo da Universidade Metodista de São Paulo, turma “Júlio Veríssimo”, em solenidade realizada na noite de ontem, em São Bernardo do Campo.
Minha fala:
I.
“EU VOS SAÚDO, DOUTORES JORNALISTAS…
É assim que quero vos saudar hoje.
Foi exatamente assim que há quase 70 anos, o cronista Rubem Braga saudou a criação, no Rio, da Escola Superior de Jornalismo. Isto em setembro de 1939.
Sempre com bom humor, o jornalista traçou ali um perfil de como imaginava ser o curso a partir do que observava no exercício da função diariamente. A bem da verdade, ele usou de fina ironia para cutucar os patrões, a chefia e falar do salário raso, da falta de tempo, do editor estressado (ou resmungão, como se dizia à época) e de como o telefone poderia ajudar ou atrapalhar uma reportagem, das mazelas da profissão.
Qualquer semelhança com os dias atuais não é mera coincidência.
II.
Mas deixemos o bom texto de Rubem Braga a esperar nova leitura nas páginas do livro Uma Fada no Front…
A objetividade do jornalismo hoje não dá vez a fadas e mistérios.
Antes se dizia:
“Aconteceu, virou notícia”.
Hoje as notícias são em tempo real…
Nem bem o fato aconteceu e lá estamos nós a informar o leitor/espectador/internauta.
Eis um terreno fértil para as muitas armadilhas que, inevitavelmente, somos obrigados a enfrentar.
III.
A tragédia da vez é o caso do assassinato da menina Isabella.
Ontem (terça), houve toda uma discussão no Observatório da Imprensa e hoje (quarta) há uma crônica modelar na Folha de S. Paulo, assinada por Clóvis Rossi, legítimo discípulo de Cláudio Abramo, em seus comentários e em sua indignação.
Tanto no programa de Alberto Dines como na coluna de Rossi foi inevitável a analogia ao Caso da Escola Base, de triste lembrança…
Olha a encruzilhada em que nos encontramos e que faz parte do nosso dia-a-dia.
E aí se abre espaço para uma discussão sem fim. Nas reuniões de pauta. No Conselho Editorial. Na avaliação diária do ombudsman. Nos papos de botequim. No cotidiano das pessoas.
Só que jornalismo não se discute, gente. Jornalismo se faz…
IV.
Embora os jornalistas adorem uma discussão, uma polêmica, um estica daqui, um puxa dali, repito:
Jornalismo não é o que se discute. Jornalismo é o que se faz…
E aí…
Devo abrir ou não o microfone diante do delegado que investiga o caso e vai falar?
Se não soubermos quem somos, o que representamos para a opinião pública, o porquê nos fizemos jornalistas, abrindo ou não abrindo o microfone, vamos incorrer em erro, com danos irreversíveis para a sociedade…
V.
Bem fica aí a reflexão…
Se posso lhes dar um último recado, ressaltaria:
Leiam sempre Rubem Braga.
Apura o estilo. Apura a sensibilidade…
Leiam sempre Clóvis Rossi.
Apura aspectos éticos. Mostra a verdadeira função social da Imprensa.
São essas a matéria prima do nosso trabalho. Para o bem ou para mal…
Fiquem atento, pois a vida não pede licença.
A vida não pede desculpa.
VI.
No mais, quero parabenizá-los. Pela belíssima escolha…
… É A MELHOR PROFISSÃO DO MUNDO.
Quem disse a frase foi o escritor e jornalista Gabriel Garcia Marques, num belíssimo artigo que vocês certamente conhecem bem.
Outro momento importante de reflexão sobre o fazer jornalístico.
VII.
Para encerrar, volto à crônica do Rubem Braga.
O que mais intrigava o cronista era explicar aos Doutores Jornalistas a única lição que sabia de cor e que era comum às redações da época.
Que assim se resumia:
“Gastei um ano aprendendo a trabalhar, dois aprendendo a trabalhar menos e três aprendendo a receber”. Boa sorte a todos
[Texto publicado no livro “Volteios – Crônicas, lembranças e devaneios”]