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Encontros e desencontros

Poderia ter acontecido em frente a um certo bar ‘Leblon’, como na canção do Alceu Valença. Talvez não. Poderia ser em um lugar qualquer do Planeta. Diante das águas límpidas do mar que banha as Ilhas Maldivas ou numa taverna em Bruges ou mesmo em qualquer restaurante de um dos shoppings transados da cidade. Sabe como é, época que antecede o Natal é assim. A gente confunde tudo mesmo. Há tanto encontros/desencontros, invasões bárbaras, de querer se achar e se perder e vice-versa…

Ah, que bom existir o tal vice-versa, pensou o moço de nome Semfuturo enquanto esperava a Fada Surfista. Bom que exista o outro lado da moeda. Sobra sempre vem a sensação das possibilidades impossíveis. Boas ou ruins, não importam. É a possibilidade que vale. Como agora, nunca imaginou estar ali, e lá estavam: ele (era ele mesmo?), ela (que chegou misteriosa e linda) e, à espreita, um amigo que não tardaria a chegar, o imponderável sr. Ano Novo (enigmático e real).

II.

Como foram parar ali, nenhum dos dois sabia dizer exatamente. Talvez quisessem a mesma coisa. Talvez… Tinham estilos diferentes e, me parece cá de fora, mundos que apenas se tangenciaram em certo lugar em determinado momento. Mas, estavam ali e havia a possibilidade – e, convenhamos, não se pode subestima-la. Até porque se cumprimentaram de um jeito bom, e refletiam um certo ar de liberdade e conquistas. Ela estava levemente bronzeada e reparou que ele reparou…

— Adoro mar.

Ele imaginou uma fada surfista a domar ondas indomáveis e tomar alguns tombos, só para o jogo não perder a graça. Mesmo assim, experimentou contrariá-la só para não perder o tempo da piada.

–Prefiro as montanhas, com hotéis aconchegantes.

Ela viu uma segunda/terceira intenções claras no comentário e desconversou. Ficou mais linda quando ajeitou os cabelos para trás do ombro. Eram claros e traziam mechas que se escondiam e se revelavam ao bel prazer e a tornavam mais luminosa.

III.

Ele atropelou-se ao contar histórias de vida, de amigos que já se foram, do livro que escreveu, do ano embaçado (que ela poderia salvar) e, num rasgo de sinceridade, disse que era absolutamente individualista – filmes, músicas, livros, teatro; ah, tinha um gosto muito próprio, peculiar mesmo. Que todos o achavam um chato, era o que queria dizer, mas se conteve.

— Não sou assim das mais descoladas. Mas, engraçado, só ando em turma.

— Prefiro ser um cara só.

— Hum, hum, entendi…

— Verdade, juro…

— Vamos comer. A salada parece ótima. Tenho horário para o trabalho.
Posso atrasar, mas não tanto…

Ele esquecera de todos os compromissos. Pensou que a tarde mal começara.

— Pois é… (foi só o que soube dizer).

IV.

Enquanto comia, observava o porte de princesa. Imaginou estar diante de um sonho prestes a se realizar. Se tentasse… e o encanto se quebrasse. Não era príncipe. Saberia esperar. Preferiu retomar a conversa.

— E o novo emprego?

Já sabia a resposta. Mesmo assim, insistiu na pergunta.

— Melhor do que o anterior. Muito aquém do que eu gostaria. Quer saber? Não me dou bem com esse negócio de horários fixos. Mas que fazer?

— Inevitável. Toda e qualquer profissão tem lá sua rotina…

Ela fez uma expressão de quem não concordara muito, mas deu de ombros.

— E os planos? – continuou curioso.

— Quero viajar. Para as Ilhas Maldivas…

Ela é mesmo inatingível para mim, pensou. Ilhas o quê? Aonde fica isso, meu Deus?

— Quanto tempo? – perguntou aflito.

— Estou guardando um dinheirinho para uns 15 dias.

— Ufa! Pensei que nunca mais fosse vê-la…

V.

Sorriu emblemática e cativante. Por vezes, parecia estar ausente. Ou a medir as palavras para não ir além do que ela própria planejou. Ele preferiu nem pensar, emendou a primeira fase que lhe veio a mente…

— Queria voltar para Brugges, na Bélgica. A cidade parece essas que se vê nos presépios. Ainda mais nesta época, com neve. Dizem que é ponto de encontro de bruxas, magos, feiticeiras, de encantos, magia e mistério…

Quase perguntou se ela não teria vindo de lá, não? Quando deu por si, ela estava rindo como se havia escutado uma enorme bobagem… Será que lê pensamentos? Esboçou um sorriso também e, por segundos, minutos?, apenas se olharam…

Quem os visse, talvez dissesse que estavam envolvidos há tempos. Quem olhasse melhor, veria que só estavam se conhecendo agora. Mas, levavam jeito pra coisa.

VI.

E se fez a hora de ir. Despediram-se com um beijo no rosto (dois por insistência dele) e não ousaram antecipar o óbvio ‘Feliz Natal’. Otimista como de hábito, ele viu nisto um gesto indicativo de que breve se reencontrariam.

— Então, tá – disseram. E se foram a desafiar o imponderável sr. Ano Novo…

Não estavam nas Ilhas Maldivas, nem em Bruges. Embora esgrimissem a tal ‘tesoura do desejo de mudar’ que Alceu canta, caminhavam pelo mesmo estacionamento de um shopping às vésperas do Natal. Não levavam nada de(o) presente. Alguém poderia imaginar que semeavam o futuro. No lugar de sacolas de compras, carregavam os mesmos sonhos e indefinições com que chegaram. Mas, sabiam, cada um a seu modo: queriam o melhor da vida. E nunca mais seriam os mesmos… Bom isso, né!

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