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Escova e a Copa de 82

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Em meio à muvuca do metrô, ouço a pergunta de alguém que não conheço e que, confesso aqui, não foi feita para mim:

– E algum brasileiro em sã consciência consegue ficar imune à Copa nesses tempos de globalização?

Estávamos todos na plataforma da Estação Sacomã, com destino à Vila Madalena. Até por isso achei natural a meiga questão que saltitou na roda dos descolados.

(…)

Como disse, não era comigo a conversa, mas, enxerido que sou, fiquei com o dito comentário a pererecar na minha oca cabecinha.

É um bom tema para a crônica de hoje, pensei.

Mas, sinceramente, não saberia respondê-la, digamos assim, criticamente.

(…)

Posso, quando muito, lhes contar a história da Copa de 82, quando eu e o Nasci ganhamos um gordo bolão de palpites na velha redação de piso assoalhado e grande janelões para a rua Bom Pastor. Ouvimos, confesso, uma indicação do amigo Escova. Este, sim, não estava nem aí para o que acontecia em campos de Espanha.

Não preciso dizer, mas digo, que eu e o Nasci éramos dos raros brasileiros felizes naquele triste 5 de julho. Até hoje conhecido, nas lides futebolísticas, como a Tragédia de Sarriá.

A surpreendente Itália bateu o selecionado canarinho por 3 a 2 e passou às semifinais do Mundial.

Entramos numa boa grana.

(…)

Entre os infelizes, estava o amigo Escova.

O motivo era bem outro.

Broken heart, meus caros.

Desconfio que naquelas semanas o rapaz não assistiu nem se ligou a qualquer um dos jogos.

Nosso Dom Juan das Quebradas do Sacomã vivia pelos cantos a se lamuriar uma das tantas paixões que o faziam viver na chamada montanha russa dos amores mal resolvidos.

(…)

O bicho não se conformava com o “chega pra lá” que levara da moça.

Elazinha deu-lhe um corte geral. Não queria papo, não atendia ao telefone (que não era celular, registre-se), mandava a amiga dizer que havia viajado e que havia “morrido” para ele.

A fossa do amigo nos preocupava um pouquinho. Outro tanto, a gente zoava – e como zoava!

(…)

Foi numa dessas zoeiras que o Nasci pediu a ele que palpitasse para o bolão do jornal.

– E aí, maior abandonado, quem você acha que vai ganhar a Copa?

Escova respondeu por responder, sem nem se dar conta do que dizia:

– Itália.

A turma deu uma sonora gargalhada.

A Azzurra fora mal pra caramba na fase de grupos. Empatou os três jogos. Classificou-se na Bacia das Almas e agora enfrentaria Argentina e Brasil. Sem chance.

(…)

Acabávamos de entregar nossas apostas pessoais. Um enfileirado de resultados que trazia o Brasil como campeão na final.

Olhei para o Nasci.

O Nasci olhou pra mim.

– Está pensando o que estou pensando, perguntou.

– Hãhã, respondi.

(…)

Azar no amor. Sorte no jogo.

Não é o que diz aquele ‘velho deitado’?

Então…

Corremos fazer um jogo conjunto, com a Itália campeã.

Não deu outra.

Faturamos o bolão.

(…)

Quanto ao Escova, nada nos cobrou pela dica.

Demos uns trocados pra ele.

De pronto, foi à floricultura e comprou um maço de rosas vermelhas que demonstrava toda sua ardente paixão.

– O quê? Quer dizer que a moça voltou? – foi minha vez de perguntar.

– Nada disso, bicho. Ela que me esqueça.

Não entendi, então.

E o Escova completou todo sapeca:

– A amiga dela é bem melhor que ela. De tantos recados que pedia pra ela levar à malvada, acabou se apaixonando pelo meu lado romântico e galanteador.

O amor é lindo…

“Como o tempo vai, e o vento vem.”

*(foto: marcelo camargo/agência brasil)

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